Como o Terceiro Setor pode enfrentar a crise econômica
Assunto foi discutido durante XVI Congresso Brasileiro do Terceiro Setor
Na última sexta-feira (18), a cidade de São Paulo sediou o XVI Congresso Brasileiro do Terceiro Setor. O evento reuniu especialistas e interessados nas áreas de contabilidade, auditoria, direito e captação de recursos, com o objetivo de promover a capacitação profissional de pessoas que atuam nas organizações da sociedade civil ou em entidades que mantêm vínculos com essas organizações.
“Nossa maior preocupação é que nós fortaleçamos as instituições sociais para que elas possam se aprimorar, se profissionalizar, trocando o altruísmo, meramente a boa vontade de fazer ações sociais, por ações consistentes”, explica Marcos Biasioli, coordenador geral do evento.
Diante do cenário de crise financeira que o Brasil enfrenta atualmente, um dos principais pontos discutidos no congresso foi como reduzir os impactos negativos dela, através, especialmente, da busca por fontes alternativas de financiamento.
“O maior desafio das instituições sociais sempre foi e continua sendo encontrar financiamento para suas obras. Enquanto nós pensamos em promoção humana, a maioria das pessoas ainda tem aquela cultura de fazer por caridade e não com a visão de criar bases sólidas para um amanhã melhor, com menos criminalidade, menos desigualdade e mais educação”, destaca Biasioli.
Neste sentido, o moderador do debate do painel de Captação de Recursos, João Paulo Vergueiro, diretor executivo da Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR), destacou a importância de se investir na disseminação da cultura de doação.
De acordo com ele, em momentos de crise, os órgãos públicos e as empresas rapidamente cortam os investimentos em projetos do Terceiro Setor, mas, ao menos no início, os indivíduos tendem a doar mais. Assim, se a instituição consegue criar e desenvolver relacionamentos duradouros com esses indivíduos, ela começa a caminhar para um desenvolvimento sustentável, que a fará não só sobreviver à crise atual como se tornar mais forte para outros momentos de dificuldade.
“As organizações brasileiras estão começando a focar a captação de recursos nos indivíduos. Assim, ao invés de ter um grande doador de 100 mil reais, você tem milhares de pequenos doadores. Dá trabalho conseguir esses pequenos doadores, mas eles são mais permanentes, acreditam mais na sua organização”, enfatiza Vergueiro.
Para promover a importância do ato de doar, um grupo de entidades do Terceiro Setor criou o Movimento por uma Cultura de Doação, que promove anualmente a campanha Dia de Doar. A ideia é incentivar pessoas de todo o Brasil a contribuírem com ONGs no dia 1 de dezembro e a divulgarem este ato nas redes sociais, inspirando outras pessoas a fazerem o mesmo. Também faz parte da campanha estimular as próprias organizações a se mobilizarem, para que elas estejam preparadas para receber as contribuições.
Moedas para mudar o mundo
Para mostrar o poder das pequenas doações realizadas por indivíduos, uma das palestras do evento abordou o Movimento Arredondar. A iniciativa funciona assim: ao comprar algo em um estabelecimento comercial credenciado, você pode arredondar o valor e essa diferença vai para instituições da sociedade civil. Assim, uma compra de R$ 15,70, por exemplo, passa a custar R$ 16 e esses 30 centavos a mais são destinados para causas sociais.
Para receber parte dos fundos obtidos pelo Movimento, é preciso que a organização tenha um trabalho alinhado a um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, promovidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), e passe por um processo seletivo, que inclui visitas técnicas.
Como as ONGs podem se beneficiar de penas alternativas
Sabe aqueles casos em que a pessoa comete um pequeno crime e não faria muito sentido mandá-la para uma cadeia superlotada? É comum que juízes optem pelas chamadas penas alternativas, que podem ser desde a prestação pecuniária, quando a pessoa paga um valor em dinheiro, até a prestação de serviços comunitários. E agora o mais interessante para o Terceiro Setor: as ONGs podem se beneficiar com essas penas, recebendo verbas ou voluntários condenados.
As verbas são administradas pelos juízes das comarcas em que os crimes são julgados e para ter acesso a elas é preciso que a organização envie um projeto que atenda a uma série de exigências, explicou Mauro Rogério Bitencourt, coordenador de Reintegração Social e Cidadania da Secretaria de Estado da Administração Penitenciária e diretor técnico da Delegacia Regional de São Paulo.
No caso do recebimento de voluntários, as instituições podem se cadastrar junto às Centrais de Penas e Medidas Alternativas (CPMA), que estão presentes em diversos municípios.
Vale destacar que as pessoas que são punidas com penas alternativas são consideradas de baixa periculosidade.
Questões de direito
No painel dedicado ao direito, foram discutidas questões como o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil (Lei 13.019/14), que deve criar certa uniformidade nas parcerias entre Poder Público e Terceiro Setor nas esferas municipal, estadual e federal; e as certificações que podem ser pleiteadas pelas entidades de interesse social, com destaque para o Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS).
Quem falou sobre o CEBAS foi Maria Helena Gabarra Osório, diretora de certificação do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que destacou o esforço do Ministério para tornar o processo de certificação mais técnico e rápido. De acordo com ela, a média de tempo entre a solicitação do CEBAS e a obtenção do certificado caiu de cinco anos, até meados de 2014, para menos de cinco meses.
Maria Helena também esclareceu uma dúvida comum entre os dirigentes de organizações da sociedade civil: é ou não permitido que eles sejam remunerados? E a resposta é: depende do objetivo da entidade. Se ela busca apenas uma certificação, como o CEBAS, ela pode, sim, ter gestores remunerados, mas, caso ela pretenda pedir a isenção de impostos para a Receita Federal, o dirigente não pode ter salário.
Contabilidade e auditoria
Outros temas abordados no congresso foram a prestação de contas, o compliance (conjunto de leis e regulamentos) contábil do Terceiro Setor e o novo Relatório do Auditor Independente.