Solidariedade e Cultura da doação – Brasil é o país com maiores possibilidades de liderar a metamorfose solidária
A solidariedade caminha de mãos dadas com a consciência crítica. Eu não consigo imaginar o mundo melhorando se nós não nos tornarmos imediatamente um grande bloco de solidariedade, se nós não lutarmos pela solidariedade.
Paulo Freire
Doar – uma palavra tão pequena com um impacto tão grande, não é mesmo?
Como a Educação pode abordar esta temática?
Por um lado, não mantendo crianças e jovens numa bolha que invisibilize as diferenças sociais próprias do Brasil e, por outro, doando a tranquilidade de que possam caminhar livremente, sem serem vítimas da falta de segurança; outro extremo.
Mas a educação tem o potencial de ir além, fomentando a cultura da solidariedade que pressupõe que o outro existe, não porque pertence a mesma classe social, mas porque é humano, habita o mesmo planeta e precisa gozar dos mesmos direitos de pertencer e de participar. E todos podemos contribuir para que assim seja!
Cada escola pode ser como um núcleo organizador de seu território, mapeando as Associações, buscando quais as necessidades e fortalezas daqueles vizinhos, daquela rua, daquele bairro. Tanto faz se as escolas são particulares.
Não precisam ser concorrentes. Podem contribuir com a escola pública, encontrar potenciais e investir em sonhos. Isso é Solidariedade!
O Ser solidário desenvolve a inteligência social a partir das relações humanas. O Ser solidário doa. Doa o que há de mais precioso: a si mesmo!
Quando você doa, descobre em si novos potenciais. Amplia seu círculo de relacionamento, conhece realidades a partir de outras perspectivas.
Mas… O que doar?
Há quem ofereça um sorriso a qualquer pessoa. Outros que saem pela rua com cartazes e ofertam abraços. Há quem presenteie com um olhar de compaixão, amizade. Sangue é uma dádiva. Cabelo. Pode-se brindar também com conhecimento. Há quem ceda espaço para encontros, um tempo em grupo.
E você? Só doa o que não te serve mais?
Qual a sua causa?
Solidariedade é entender que todos temos algo que pode ser doado!
A Escola é um rico espaço para o desenvolvimento da Solidariedade e da cultura da doação! Uma escola pode, sendo pública ou privada, organizar seu entorno ensinando como reivindicar, cobrar das autoridades, enquanto aprende como gerir o caos típico de momentos de falta de verba, falta de segurança, falta de tempo das famílias.
Paremos de obrigar a que as crianças e jovens lidem com problemas idealizados quando elas e eles têm enorme potencial para lidar com questões cotidianas e reais. Podem participar!
Precisamos nos cobrir com o manto da solidariedade capaz de criar redes, gerir sonhos, despertar potenciais adormecidos pela necessidade da sobrevivência.
No Brasil, talvez a síndrome de vira-lata ainda seja nosso grande obstáculo porque muitos de nós se vê como pequenos, incapazes de fazer pelo outro. Ainda estamos focados na própria sobrevivência. Muitas horas de trabalho, tempo imenso gasto em congestionamentos nos grandes centros urbanos, renda insuficiente para manter necessidades pessoais em dia.
E assim, relegamos às decisões aos políticos; as doações, aos que têm mais dinheiro; os filhos, terceirizamos às escolas.
Porém, precisamos desenvolver aquele sentido de pertencimento e de participação que implica assumir que todos somos responsáveis pela transformação positiva de nossas comunidades e que não se educa para a cidadania, mas no exercício dela.
Não basta votar, delegar a terceiros o poder de nossas decisões. É mister que nos organizemos, doemos nossos saberes e fazeres aos nossos vizinhos. Compartilhemos os saberes entre todos, dentro de nossos pequenos contextos e nos associemos com outros para mudar nossa rua, nosso bairro, nossa cidade, nosso Estado e, do micro para o macro, transformemos a sociedade planetária.
Como desenvolver a cultura da doação? Como o Brasil lida com isso? Que fatores estão envolvidos no contexto da doação?
Definindo o verbete Solidariedade, a partir da obra de Paulo Freire, Telmo Adams propõe considerar o contexto sócio-histórico a que ela está, necessariamente, condicionada.
As condições culturais não foram favoráveis para desenvolver uma solidariedade intrinsecamente relacionada com uma cultura do público, sem submissões e mutismos, ajustamentos e acomodações. Essa solidariedade política e social é resultado de um processo educativo de desenvolvimento de disposições e exercício prático de participação, de diálogo com responsabilidade e que combina com uma sociedade radicalmente democrática.
(Adams, 2018, p. 437)
Trata-se menos de assistencialismo e mais de empatia e senso comunitário. Se é verdade que a cultura de doação de um país é indício da maturidade e evolução da consciência coletiva de uma sociedade, então, de fato, ainda somos um bebê. O WGI (World Giving Index) sigla em inglês para Índice de Solidariedade Mundial avalia três requisitos:
- Ajudar um estranho – onde o Brasil ocupa a sexagésima posição
- Doar dinheiro a uma ONG – Brasil ocupa o quinquagésimo nono lugar
- Voluntariar-se por uma causa social – Brasil é o septuagésimo nono no ranking
A boa notícia é que, apesar do número de pessoas físicas que doam dinheiro à ONG tenha caído, aumentou o número de pessoas que ajudam estranhos e que se voluntariam.
E escuto o mestre Morin, que nos fala da necessidade de uma metamorfose, de uma reforma moral, lograda através de profundas mudanças no modo de educar e numa economia ecológica e solidária. Ele diz-nos que solidariedade é a palavra que pode modificar positivamente o futuro da humanidade. Curiosamente, Morin considera que o país com maiores possibilidades de liderar essa metamorfose solidária é o… Brasil. (PACHECO, 2012, pp. 44, 45).
Se a Educação fomentar a solidariedade, podemos, no médio prazo, melhorar nosso lugar no ranking e, mais importante, organizar nossa sociedade civil de maneira que ser solidário seja algo tão natural que já não precise ser fomentado.
Marjory Muniz
20/04/2020 @ 09:18
Quem é Adams?