Agronegócio bate recorde, enquanto fome aumenta no Brasil
Enquanto produtores agrícolas focam em itens para exportação, para receber em dólar ou euro, preço dos alimentos no país sobe. Alta dos preços e do desemprego tem levado milhões de brasileiros à fome
O agronegócio no Brasil está batendo recordes. Os produtores e empresários só têm a comemorar. Em 2020, em meio às dificuldades econômicas geradas pela pandemia, a agropecuária foi o único setor a crescer. Com tanto alimento sendo produzido, por que 19 milhões de brasileiros passam fome?
No final do ano passado, pouco mais da metade da população brasileira (116,8 milhões) convivia com algum nível de insegurança alimentar, segundo pesquisa realizada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan).
Insegurança alimentar é a falta do acesso pleno e regular a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, como moradia.
Com o desemprego, a renda da população caiu. Em paralelo, o preço dos alimentos subiu, dificultando o acesso dos mais pobres, que precisam de programas sociais.
Em comparação, a remuneração pelo cultivo de alimentos no mercado interno tem sido pouco atrativa, mesmo para o pequeno produtor. A chamada agricultura familiar é responsável por boa parte do que chega à mesa dos brasileiros. Os grandes produtores não estão interessados em vender para o próprio país, e preferem a venda externa, para receber em dólar ou euro.
A fome em um país que é grande produtor de alimentos como o Brasil não é considerada um paradoxo para o agrônomo e pesquisador Paulo Petersen, integrante do Núcleo Executivo da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA).
Ele explica que a produção brasileira não é voltada para a alimentação, mas sim para commodities, principalmente o cultivo de grãos usados em ração para animais.
Commodities são produtos que funcionam como matéria-prima. Elas podem ser desenvolvidas em larga escala e estocadas sem perder a qualidade. No caso do agro, são itens como soja, trigo, milho e café.
“Basicamente tanto um como o outro é voltado para a exportação. Então, a produção interna é muito voltada para a indústria e não diretamente para o consumo humano, isso que explica a aparente contradição”, afirma.
Petersen destaca ainda que, atualmente, o Brasil tem que importar alimentos nos quais antes era autossuficiente. Um exemplo é o arroz, que teve um aumento de quase 30% na importação em 2020 na comparação com 2019.
Foi no Brasil onde os preços subiram mais depressa na pandemia, apontou um estudo da Universidade de Oxford com dados do Banco Mundial. Em um ano, o quilo do arroz subiu quase 70%; o feijão preto, 51%; a batata, 47%; a carne, quase 30%; leite, 20%; e no óleo de soja a alta foi de 87%.
Em 2020, o Brasil foi responsável por 19% dos grãos produzidos no mundo, e continua sendo o segundo maior exportador de carnes. Mas sua população continua faminta, desempregada e doente.
Fonte: G1