Cafeteria emprega pessoas com Síndrome de Down em São Paulo
O Chefs Especiais Café, primeiro café inclusivo do país, foi reinaugurado em novembro. Conheça os funcionários do estabelecimento
Por: Mariana Lima
Dani, Fabrício, Rodrigo, Gabriel e Matheus são funcionários de uma cafeteria em São Paulo. Eles se dividem entre as funções de barista, chef e atendente no local. Quando os clientes chegam, eles os cumprimentam, perguntam o nome e os acompanham até a mesa.
A conversa pode continuar durante todo o tempo de permanência do cliente ali. “Se você procura apenas um bom café, você pode encontrar em diversos lugares. Mas só aqui você vai encontrar amor e carinho”.
Essa é definição de Simone Lozano para o Chefs Especiais Café, o primeiro café inclusivo do Brasil, em que os atendentes são pessoas com Síndrome de Down.
Simone é presidente e fundadora do Instituto Chefs Especiais, instituição que atua há 13 anos em prol da inclusão social de pessoas com Síndrome de Down por meio da gastronomia, promovendo a autonomia e a inserção no mercado de trabalho.
“O Café serve para mostrar a capacidade deles. Eu comecei por um desejo de fazer a diferença, e não tinha a pretensão de conseguir tudo o que já alcançamos”.
O Instituto Chefs Especiais realiza a capacitação dos alunos nas áreas de culinária, confeitaria e panificação. São realizadas oficinas como a ‘Down Cooking’ e treinamentos para o atendimento de salão.
Todos os cursos são oferecidos na sede do Instituto, que conta com a parceria de empresas como a Friboi, GRSA Compass e Barilla.
“Não são muitas as empresas que estão preocupadas, que têm esse olhar de inclusão. Mas as empresas que nos procuram reconhecem o trabalho que é oferecer tudo isso, e abraçam a causa”.
Os cinco funcionários da cafeteria, que foi planejada para ter um ambiente no estilo “bad boys” e ao mesmo tempo alegre e aconchegante, são alunos do Instituto.
Para serem selecionados para o Café, todos passaram por uma avaliação em seus históricos, levando em consideração se estavam no momento para esta etapa.
Eles são contratados no regime CLT, fazem divisões de turnos e tarefas, e continuam a participar das aulas no Instituto.
“Já temos alguns clientes fiéis. Tem uma cliente que sai do trabalho no fim de tarde e vem para cá. Ela toma uns 30 cafés, só para colaborar e conversar com eles”, conta Simone.
Muitos pais com filhos com Síndrome de Down visitam o Café, tiram fotos com os funcionários, e continuam a interagir de forma carinhosa nas redes sociais. “Os pais, quando vêm até o Café, olham com esperança para os filhos”, revela Simone.
Vai um cafezinho?
O Chefs Especiais Café foi reinaugurado em novembro de 2019, em um novo endereço, na região do Jardim Paulista, e agora em parceria com a empresa 3 Corações. A cafeteria funciona com cinco funcionários com Síndrome de Down e três supervisores.
Danielle Gontijo, 25, descobriu a paixão pela culinária durante os cursos do Instituto Chefs Especiais. “Meu sonho agora é ter o meu próprio bufê, fazer as festas de crianças. Eu gosto muito dos temas infantis”.
A família de Dani a incentiva no sonho. Para sua mãe, Edna Aparecida, 48, o Instituto potencializou o crescimento da filha.
“Desde que ela começou, ela passou a olhar mais para o futuro, planejar para ter o próprio negócio. Ela já fez curso de fotografia, e já trabalhou com isso. A cada dia é um novo aprendizado, tanto para ela como para mim”.
Edna reflete sobre a inclusão no mercado de trabalho. Para ela, muitas empresas funcionam com uma lógica de inclusão que não valoriza, que não tem o olhar de atenção.
“No Café, eles são elogiados o tempo todo, existe uma preocupação com o desenvolvimento deles. Não é uma inclusão de ‘levar e deixar ali’. As pessoas que vêm aqui sabem o tipo de ambiente que vão encontrar, e continuam a vir”.
Dani trabalhou por um ano no antigo endereço do Café, que finalizou as atividades após o fim do contrato de locação, e voltou para trabalhar no novo espaço. Ela começou a participar dos cursos no Instituto aos 17 anos.
“Eu gosto de trabalhar aqui. Eu faço o pão de mel e os panetones, vejo se os clientes estão gostando de tudo. Tem a lojinha também. É meu lugar”.
A lojinha citada por Dani fica em um espaço cedido pelo Instituto, dentro da cafeteria, e pertence a Dani e Matheus. Todo o dinheiro obtido com a venda dos doces da loja vai para eles. Quando estão trabalhando no Café, suas mães ficam responsáveis pela lojinha.
Matheus Maester, 26, frequenta o Instituto há 8 anos. Começou com aulas esporádicas, e aos poucos foi aumentando a frequência.
Pelo Instituto, ele já trabalhou como garçom em uma empresa de advocacia. A convite de Simone, foi trabalhar no Chefs Especiais Café.
Ele realiza o atendimento e conversa com os clientes, chegando a recepcioná-los na porta. “Gosto de trabalhar aqui, e quero continuar trabalhando. Meu sonho é continuar estudando, ter novos trabalhos e casar com a Dani”, conta com um sorriso.
Matheus mora em Itaquera, na Zona Leste de São Paulo. Ele ainda está se acostumando com o caminho, mas recebe o apoio da mãe, Sandra Maestre.
“Ele já é um empreendedor. Vende e faz as bolachas dele. Tento incentivar a autonomia dele em casa também, criar a independência. O Instituto foi um divisor de águas para nós dois”.
Há 6 anos, Fabrício Schahin, 29, conheceu o Instituto. Interessou-se pela proposta do Chefs Especiais durante uma aula experimental de culinária. Com o auxílio de Simone, ele conseguiu seu 1° emprego, no qual ficou nos últimos 6 anos.
Após conhecer o Café, Fabrício se encantou pelo local e acabou decidindo trocar o antigo emprego para trabalhar na cafeteria. Há 3 semanas, ele vem cuidando das máquinas de café e dando suporte aos colegas e na supervisão.
Fabrício interage com os clientes, explica os tipos de café, e recebe elogios. “Eu já gostava de cozinhar. No próximo ano vou começar no Instituto um curso de barista profissional e, quem sabe, mudo de setor no Café também”.
Assim como Dani, Rodrigo Marques, 42, trabalhou no antigo endereço do Café e escolheu continuar no serviço mesmo com a mudança.
Sobre as qualidades necessárias para trabalhar com o público, Rodrigo ressalta que “tem que ter muito respeito com os outros, e não pode ter muitas críticas”.
Além de trabalhar na cafeteria, Rodrigo administra outras tarefas em sua vida fora do expediente de trabalho. Há 21 anos faz aulas de teatro na ADID – Associação para o Desenvolvimento Integral do Down.
“O Café e o teatro são as minhas duas paixões. Também já fiz cinema, participei de comerciais. Estou no Café há 1 mês e pretendo continuar. É muito bom estar aqui”.
O membro mais novo da equipe é Gabriel Oliveira, 19 anos. Sua mãe foi a responsável por apresentá-lo ao Instituto e ao Café.
“Eu gostei e quis vir trabalhar aqui assim que terminei o curso lá no Instituto. Aqui eu sirvo o cliente, limpo as mesas, e converso com eles”.
A família acompanha o desenvolvimento de Gabriel, e chega a ir ao Café para apoiá-lo. Para o futuro, ele quer descobrir outras coisas, novas oportunidades.
“Gosto de mexer com notebook e internet. Quero melhorar no que faço. Se eu for cursar uma faculdade, será de engenharia”.
Ao sair do Chefes Especiais Café, uma cliente diz para Matheus e Gabriel, que estão na porta: “Tchau! Vocês são uns amores”.
Cada cliente que vem até a cafeteria já chega com um sorriso, que continua em seus rostos até a hora da despedida.
Serviço
Chefs Especias Café
Endereço: Alameda Tietê, 43 – Loja 15 – Jardim Paulista, São Paulo – SP, 01417-020
Funcionamento: de segunda a sábado, das 10h às 20h.