Estudo da Unifesp relaciona óbitos por Covid-19 a deslocamentos
Entre os dez distritos da cidade de São Paulo que registram o maior número de óbitos por Covid-19, nove também lideram no número de viagens de transporte público
Por: Mariana Lima
De acordo com dados da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), os distritos da capital paulista com os maiores índices de óbitos por Covid-19 são locais com maior presença de autônomos, donas de casa e pessoas que usam o transporte público.
Nos distritos com maior número de pessoas que usam carro, são empregadoras ou profissionais liberais, há menos óbitos.
Os dados compõem parte de um material em produção pelo Observatório de Conflitos Fundiários do Instituto das Cidades da Unifesp.
As informações foram colhidas dentro de uma pesquisa feita sobre desigualdades e vulnerabilidade no contexto da Covid-19, em parceria com a Fundação Tide Setúbal.
A distância aproxima a Covid-19
Os dados apresentados reforçam a percepção de que as pessoas mais pobres, que continuaram se deslocando devido ao trabalho durante a pandemia, são as maiores vítimas.
O estudo cruza os dados dos registros de mortes nos 96 distritos da capital paulista com os da última pesquisa de Origem e Destino do Metrô, realizada em 2017.
A pesquisa do metrô reúne diversas informações das pessoas que se deslocam pela cidade, incluindo os meios usados, profissão e tempo de viagem.
Através do cruzamento da pesquisa com o registro dos óbitos, alcança-se um coeficiente de determinação, que varia de 0 a 1, que revela o quanto aquelas variáveis explicam esses óbitos. Quanto mais próximo de 1, pior.
Nos distritos em que há uso do transporte público como meio principal de viagem, o número é de 0,80. Nos locais em que predominam os trajetos a pé, o coeficiente é de 0,78. Quando o automóvel indica a principal forma de locomoção no distrito, o número cai para 0,39.
De acordo com o pesquisador responsável pelo estudo, o professor do Instituto das Cidades da Unifesp Kazuo Nakano, com base no índice, a quantidade de viagens de transporte coletivo explica 80% da quantidade de óbitos.
Entre os 10 distritos da cidade com mais mortes pela Covid-19, nove também lideram no número de viagens por transporte público.
O Grajaú, distrito do extremo sul, por exemplo, é o bairro que mais usa o transporte público. No total, são 384.770 viagens por dia. Além disso, é o terceiro em número de mortes, com 360 registradas até o momento.
Em contrapartida, o distrito de Perdizes, bairro nobre na zona oeste, ocupa a terceira posição em relação ao número de viagens de automóveis e, no quadro de mortes, está em 63º entre os 96 distritos.
Outros estudos e comparações
A Faculdade de Arquitetura e Uurbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) apresentou um estudo que também relaciona a mobilidade com os casos de Covid-19.
No entanto, foram utilizados dados do DataSus sobre as áreas com concentração de moradores que foram hospitalizados por Covid-19 com dados públicos da Companhia de Transportes de São Paulo (SPTrans).
O resultado do estudo foi semelhante ao da Unifesp, apontando que o deslocamento até o trabalho influenciou no contágio na cidade.
Enquanto algumas profissões apresentam um alto índice de relação com as mortes pela doença, outras são quase totalmente poupadas.
Para exemplificar, de uma máxima de 1 na relação entre mortes e a profissão, autônomos – incluindo diaristas e camelôs – chegam a 0,79. As donas de casa ficam logo atrás, com 0,78.
Em relação aos distritos com mais mortes, o Grajaú também é o que possui mais profissionais autônomos, com base nas viagens da pesquisa de Origem e Destino.
O Sacomã, também entre os primeiros do ranking de mortes, lidera na população de donas de casa.
Em oposição ao cenário, empregadores têm taxa de 0,0079. No caso de profissionais liberais, a situação é semelhante, com grau de correlação de 0,0245.
O bairro com mais profissionais liderais, segundo a pesquisa de Origem e Destino, é a Vila Mariana, região de classe média na zona sul, que ocupa o 35º entre os distritos com mais mortes.
Já Perdizes é o distrito com maior número de empregadores e também tem menos mortes.
Fonte: Folha de S. Paulo