Memorando revela que Geisel autorizou execuções na ditadura
89 pessoas morreram ou desapareceram no Brasil, por motivos políticos, a partir de 1º de abril de 1974
Por: Isabela Alves
Um memorando secreto da CIA, tornado público recentemente pelo governo americano, revelou que o general Ernesto Geisel, presidente do Brasil entre 1974 e 1979, sabia e autorizou a execução de opositores durante a ditadura militar.
O documento de 11 de abril de 1974, revelado recentemente pelo pesquisador Matias Spektor, da Fundação Getulio Vargas (FGV), foi elaborado pelo então diretor da CIA, William Egan Colby, e endereçado ao secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger.
O encontro se deu em 30 de março de 1974 e, segundo a declaração, o general Milton relatou que o Brasil não poderia ignorar a “ameaça terrorista e subversiva” que estava acontecendo e que os métodos “extra-legais deveriam continuar a ser empregados contra subversivos perigosos”. O documento ainda afirma que Geisel teria orientado o então chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) que viria a substituí-lo na Presidência, João Baptista Figueiredo, a autorizar pessoalmente os assassinatos.
Partes do memorando ainda continuam sob sigilo.
Mortos e desaparecidos
89 pessoas morreram ou desapareceram no Brasil por motivos políticos, entre 1º de abril de 1974 e o fim da ditadura. Além dos casos confirmados, há outros 11 possíveis.
Entre as vítimas desse período estão o jornalista Vladimir Herzog, assassinado em 25 de outubro de 1975 após se apresentar voluntariamente ao Centro de Operações de Defesa Interna, um órgão militar da ditadura; e o metalúrgico Manoel Fiel Filho, que foi torturado até a morte, em 17 de janeiro de 1976, nas dependências do Destacamento de Operações de Informações (DOI) do II Exército, em São Paulo.
Um relatório divulgado pela Comissão Nacional da Verdade aponta que, no total, ocorreram 434 mortes e desaparecimentos durante a ditadura militar; 377 agentes foram responsáveis pela repressão. A identificação foi feita com base em documentos, depoimentos de vítimas e testemunhas.
Nota do Instituto Vladimir Herzog
O Instituto Vladimir Herzog (IVH) lançou uma nota no dia 11 de maio, falando da divulgação do memorando da CIA: “Apesar de não haver nenhuma surpresa, essa é mais uma prova de que não houve porões da ditadura; e sim uma política de Estado de terror, desaparecimentos forçados e assassinatos”.
Na nota, o instituto afirma que a revelação do documento reforça as conclusões e recomendações do relatório final da Comissão Nacional da Verdade, lançado em dezembro de 2014, especialmente sobre a obrigatoriedade da reinterpretação da Lei da Anistia.
Segundo o IVH, é necessário a revisão urgente dessa lei, uma vez que, da maneira como está estabelecida, ela perpetua a impunidade, propicia uma injustiça continuada, impede às vítimas e a seus familiares o acesso à justiça, e afronta o dever do Estado de investigar, processar, julgar e reparar as gravíssimas violações de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar.
Além disso, chama a atenção para o fato de que é inaceitável a explicação adotada pelas Forças Armadas de que tais violações se constituíram em alguns poucos atos isolados ou excessos, gerados pelo voluntarismo de alguns militares.