Ministério Público Federal denuncia tortura em presídios no Pará
Segundo MPF, presos relataram sofrer torturas e maus-tratos em série nos presídios em que houve intervenção federal
Por: Mariana Lima
Após o massacre de julho deste ano no Centro de Recuperação Regional de Altamira, que deixou 62 mortos – sendo o segundo maior massacre no sistema prisional brasileiro -, 13 prisões do estado do Pará passaram a contar com a presença da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP).
Quase dois meses depois, surge uma denúncia assinada por 17 dos 28 procuradores do Ministério Público Federal que atuam no Estado.
A denúncia conta com depoimentos de presos, familiares e agentes penitenciários estaduais que apontaram a ocorrência de agressões generalizadas, alimentação imprópria, falta de medicamentos essenciais e a proibição da entrada de advogados.
Os relatos também incluem agressões com pauladas de vassouras, ataques diários com balas de borracha e spray de pimenta, empalamento pelo ânus, e perfuração dos pés com pregos.
Os procuradores relataram que os crimes teriam sido cometidos, em maioria, por agentes federais que participam da força-tarefa do Ministério da Justiça e Segurança Pública, comandado pelo Ministro Sérgio Moro.
Chegaram para o Ministério Público Federal (MPF) fotos e vídeos que mostram presos feridos, além da superlotação e as condições sanitárias precárias a que estão expostos.
No documento em questão, um preso conta que, após a entrada dos agentes federais no local, os detentos ficaram nus por 9 horas e 15 minutos [das 07h30 às 16h45]. Durante esse tempo, o detento conta que eles foram torturados enquanto estavam sob o sol quente, recebendo spray de pimenta e apanhando com cabos de vassouras nas costas.
Esse mesmo detendo revelou também que viu agentes federais e estaduais tentando introduzir o cabo de uma arma calibre 12 na bunda de um rapaz. Os detentos apontam serem frequentes o uso de spray de pimenta nos internos enquanto estão nas celas.
Os depoimentos colhidos pelos procuradores revelam que o uso de agressões físicas se tornaram mais frequentes após a intervenção federal.
As informações de parentes e membros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) apontam que a força-tarefa federal não estaria medicando os presos com HIV e tuberculose. Presos feridos e lesionados em decorrência das violências físicas impostas pelos agente federais também não estariam recebendo o atendimento médico.
Os procuradores também ouviram os relatos de representantes da Sociedade Paraense de Defesa dos Direitos Humanos (SDDH) e do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura [organismo vinculado ao Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos] que visitaram as unidades prisionais assim como a OAB.
Uma advogada representante da OAB que realizou uma visita a uma das unidades apontadas, relatou que a situação dos presos é similar a de um campo nazista.
Além dos detentos, funcionários estaduais do sistema penitenciário paraense também estariam sendo humilhados pelos agentes federais.
Extensão da violência
Os abusos também se estendem para outras unidades prisionais do sistema carcerário. O Centro de Recuperação Feminino (CRF) apresentou relatos do dia em que agentes da FTIP entraram na unidade às 4h da manhã “soltando bombas, espirrando spray de pimenta e colocando as presas para foram das celas apenas com as roupas íntimas”.
As mulheres que desmaiavam teriam sido arrastadas e acordadas com spray de pimenta no rosto. Outras teriam sido obrigadas a se sentarem em um formigueiro em um dos pavilhões usando apenas as peças íntimas. Os relatos também apontam para agressões com choques elétricos e o convívio forçado com as fezes e urinas de ratos.
O que diz a força-tarefa?
As denúncias resultaram no afastamento do coordenador da força-tarefa, Maycon Cesar Rottava. O juiz federal Jorge Ferram de Oliveira Junior informou em sua decisão liminar que existem fortes indícios de que Rottava cometeu improbidade administrativa.
O Departamento Penitenciário Nacional (Depen), órgão do Ministério da Justiça e Segurança Pública, negou que esteja ocorrendo tortura nas unidades que estão sob sua custódia.
Na quarta-feira (09/10), o DEPEN informou em outra nota que pelo menos 64 presas e 11 presos mentiram em seus depoimentos, de acordo com laudos periciais assinados por magistrados da Vara de Execuções Penais do Pará.