O homem que se voluntariou a Auschwitz para derrotar os nazistas
Witold Pilecki foi um oficial do Exército polonês que se voluntariou para ser encarcerado em Auschwitz, com o objetivo de descobrir os planos nazistas e repassar informações para a resistência
Por: Juliana Lima
Witold Pilecki foi um oficial do Exército polonês que se voluntariou para ser encarcerado no campo de extermínio de Auschwitz, na Polônia, um dos maiores símbolos do genocídio nazista na Segunda Guerra Mundial. Por dois anos e meio, ele permaneceu no campo de extermínio com a missão de obter informações sobre o funcionamento do local e criar uma rede de resistência interna.
Nascido em Oloniec, no norte da Rússia, em 1901, Witold Pilecki lutou no Exército polonês contra a invasão nazista em 1939. Com a rápida anexação da Polônia pela Alemanha de Adolf Hitler, os alemães iniciaram prisões em massa entre a população local, com atenção especial para a captura dos militares poloneses que os haviam combatido no campo de batalha.
Segundo o sobrinho de Pilecki, Andrzej Marek Ostrowski, que era apenas um menino na época, o combatente ficou hospedado por um tempo em sua casa depois da derrota de 1939. Ainda muito ativo na resistência, Pilecki se voluntariou a ir a Auschwitz, já que na época pouco se sabia sobre os planos alemães para o local. Quando soube que haveria uma inspeção na casa da irmã, o homem fez questão de estar presente para ser capturado.
“No início da manhã, o zelador do prédio, Jan Kilianski, veio correndo à nossa porta e se ofereceu para se esconder em um esconderijo que eles tinham no porão, mas meu tio disse a ele que desta vez ele não iria usá-lo. Meu tio arrumou tudo e se vestiu. Bateram na porta e era um grupo de soldados, alguns em trajes civis. Eles perguntaram se havia algum homem na casa. Eu estava na minha cama e meu ursinho de pelúcia estava no chão. Meu tio me entregou ele e me beijou na testa. Quando passou por minha mãe, disse: ‘Informe a pessoa apropriada que eu cumpri a ordem’. Então nós percebemos que tinha sido planejado”, conta Ostrowski.
Preso em Auschwitz, Pilecki encontrou uma realidade diferente da que esperava. Com o tratamento extremamente cruel dos nazistas, nem sempre havia espaço para solidariedade entre os presos, que buscavam apenas uma forma de sobreviver.
“No início, ele disse que seus dentes foram quebrados porque os alemães queriam que ele carregasse a placa com o número da prisão na boca e ele recusou”, conta o historiador Wróblewski. “Eles então o espancaram com uma bengala e o torturaram”.
Mesmo assim, o homem conseguiu criar uma rede interna de resistência com cerca de 500 pessoas, que buscavam obter informações de inteligência nos diferentes departamentos e áreas do campo para que pudessem compartilhar com a resistência de fora.
Por quase três anos, Pilecki enviou relatórios nos quais fazia um relato de como Auschwitz deixou de ser um centro de detenção destinado a prisioneiros de guerra poloneses para se tornar um grande local de extermínio de judeus de toda a Europa.
Depois que seus apelos para que Auschwitz fosse atacada foram sistematicamente ignorados, Pilecki decidiu fugir do campo de extermínio. Quando ele e dois companheiros foram designados para trabalhar na padaria do campo, que ficava fora do perímetro de segurança máxima, eles conseguiram desativar os fios do alarme, abrir a pesada porta de metal e escapar. Um feito e tanto, já que era quase impossível escapar das mãos dos nazistas na época.
Fora de Auschwitz, Pilecki continuou lutando contra os nazistas e participou do levante de Varsóvia em 1944, quando a resistência tentou recuperar a capital polonesa. A tentativa foi fracassada e Pilecki foi preso novamente pelos nazistas, desta vez em um campo destinado a prisioneiros de guerra. Já no ano seguinte, com a derrota inevitável de Hitler, ele foi liberto por tropas americanas.
Com a derrocada do nazismo, Pilecki passou a lutar contra o governo comunista que se instalou na Polônia. Em 1947, foi preso pelas autoridades polonesas e condenado à morte.
“Minha tataravó lembrou-se muito claramente que um dia, quando ela foi levar coisas para a prisão, eles lhe disseram que ele não estava mais lá. Por 40 anos, ela esperava que eles o tivessem levado para uma mina na Sibéria ou em outro lugar e um dia ele iria aparecer novamente”, conta Krzysztof Krosior, tataraneto de Pilecki.
No entanto, em 1990, com o colapso do comunismo na Europa Oriental, um documento oficial das autoridades polonesas foi descoberto e revelou o pior desfecho para a história de Pilecki: ele havia sido baleado sem que a família fosse informada. Apesar de suas atitudes nobres e corajosas, o homem foi esquecido pela história até recentemente, quando sua história passou a ser contada como a de um herói.
Fonte: BBC