A importância das festas de fim de ano para as organizações do 3º setor
O fim do ano costuma deixar as pessoas mais emotivas e solidárias, e é um bom momento para sensibilizar doadores para a sua causa
por Artur Ferreira
As festas de Natal e Ano Novo são marcos anuais para a reunião de parentes e amigos, representam uma época de presentear e ser presentado, não só economicamente, mas também emocionalmente.
A época costuma deixar as pessoas mais emotivas, e o famoso “espírito natalino” traz à tona a solidariedade.
No fim do ano, também aumentam as doações para causas sociais, tanto financeiras quanto as que envolvem mantimentos e ações de voluntariado. Mas como é a generosidade do brasileiro ao longo de todo o ano?
Sete em cada dez brasileiros (70%) afirmam ter feito alguma doação em dinheiro ao longo de 2018. Além disso, cerca de metade da população (53%) fez algum trabalho voluntário nesse mesmo período.
Entre os doadores entrevistados, 52% doaram para organizações religiosas em 2018, 38% doaram para causas relacionadas a crianças e 31%, para causas relacionadas à ajuda aos mais pobres.
Essas informações fazem parte Giving Report 2019 Brasil, realizado pela Charities Aid Foundation em parceria com o Instituto para o Desenvolvimento do Investimento Social (IDIS). A publicação foi feita em 2019, com dados do ano anterior.
Para Andrea Wolffenbüttel, diretora de comunicação do IDIS, as comemorações de fim de ano são incentivos para motivar a doação ou o voluntariado entre os brasileiros. Ela também afirma: “em geral, o brasileiro é solidário”.
Wolffenbüttel explica que o número de doações em 2018 teve uma queda em relação a anos anteriores, no Brasil, e um dos principais fatores foi a crise econômica. A quantia típica doada (mediana) foi R$ 200.
Outro ponto para o qual Wolffenbüttel chama a atenção diz respeito à motivação para doar. No Brasil, existe muito mais a “doação emocional” do que a “doação racional”, quando as duas são necessárias para se obter uma cultura de doação.
Doação emocional e barreira cultural
A diretora de comunicação do IDIS exemplifica que em casos como o de Brumadinho, que trazem comoção nacional, movimentam-se grandes volumes de doações de mantimentos e dinheiro para a região, mas esses mesmos doadores nunca tinham pensado em doar e se solidarizar com as organizações da sociedade civil (OSCs) que fiscalizavam e alertavam sobre os riscos de rompimento das barragens da região.
Outro exemplo citado pela especialista é o de se variar as pautas atendidas. Ela cita uma palestra da qual participou sobre o combate à corrupção. “A maioria das pessoas levantou a mão para falar que era contra”, mas, quando foi perguntado quem doava e incentivava organizações de combate à corrupção, muitos abaixaram as mãos.
“O brasileiro quer participar, mas ele não tem muito as noções práticas para isso”, afirmou. De acordo com ela, a doação “não é um assunto que se debate” no Brasil.
Para a especialista, existe uma barreira cultural para se falar sobre a doação, principalmente devido à herança católica. Para os brasileiros, falar sobre o assunto significa ostentar muito dinheiro ou afirmar que é melhor do que os outros, como um sinal de falsa humildade.
A diretora rebate essa ideia dizendo que é necessário, sim, falar sobre o tema. Além disso, a falta do assunto no cotidiano levanta outros mitos, como a desconfiança para com o terceiro setor.
Wolffenbüttel afirma que existem iniciativas da sociedade civil que visam tornar o brasileiro médio mais próximo das organizações e das causas sociais. Movimentos como o Dia de Doar e projetos como o Descubra sua Causa trazem novos doadores e voluntários, e ajudam as pessoas a conhecerem novas causas com as quais elas se identificam.
Descubra a sua Causa
Pensando na necessidade de incentivar a cultura de doação e a participação em projetos de impacto social, o IDIS – em parceria com as plataformas de doação BSocial e Simbiose Social, o portal de voluntariado Atados e o Catraca Livre – lançou o Descubra sua Causa 2.0, a segunda fase da campanha Descubra sua Causa.
A campanha, segundo Wolffenbüttel, é uma forma divertida para o público leigo começar a entender as causas que lhe agradam e quais são as instituições próximas dela que o doador pode ajudar.
Basicamente, o usuário responde a um questionário que filtra seus principais interesses e, ao final do quiz, é mostrada uma lista de tópicos mais próximos do que o doador em potencial defende.
A BSocial, nessa parceria, oferece uma lista de 46 possíveis organizações para destinar doações online, que podem ser filtradas por temas, e todas as organizações dentro da plataforma passam por uma vistoria e aprovação do IDIS antes de poderem receber as doações.
De acordo com Maria Eugênia, curadora e co-fundadora da plataforma, todo o dinheiro que circula na BSocial é monitorado e referenciado como recurso livre, ou seja, após o recebimento da doação a organização é livre para utilizar aquele dinheiro como necessita.
88% do dinheiro doado vai para a organização escolhida, e 12% do dinheiro é utilizado para a manutenção do serviço. Além disso, em parceria com o Instituto Phi, a BSocial gera relatórios trimestrais para que os doadores possam ver o quanto as suas doações impactaram o trabalho daquela organização.
Eugênia reconhece que existem épocas com maiores índices de doação, porém a meta é sempre incentivar o doador para manter uma frequência nesse processo.
“O objetivo é tornar aquele doador um doador recorrente”. E Eugênia completa dizendo que uma das formas de fazer isso é mostrar “o quanto o recurso [doado] transforma”.
Dia de Doar
Outro movimento que tem se tornado referência nos últimos anos é o Dia de Doar, a versão brasileira do #GivingTuesday, que significa “terça-feira da doação”. A campanha internacional nasceu em 2012, nos Estados Unidos.
A versão brasileira do movimento ocorreu pela primeira vez em 2013 e a representante oficial do Dia de Doar no Brasil é a Associação Brasileira de Captadores de Recursos (ABCR), organização fundada há 20 anos.
Na edição de 2018, o Dia de Doar impactou 22 milhões de pessoas nas mídias sociais, o que resultou em R$ 1,2 milhão doados online. Agora em 2019, o Dia de Doar ocorreu em 3 de dezembro. A campanha é sempre realizada na terça-feira imediatamente após o Dia de Ação de Graças.
Segundo João Paulo Vergueiro, administrador e diretor executivo da ABCR, o principal objetivo da associação é fortalecer e fomentar o ecossistema de organizações do terceiro setor a tornarem-se financeiramente sustentáveis.
“Para uma organização da sociedade civil gerar mais impacto, ela precisa ter uma boa capacidade financeira, sendo apoiada principalmente por quem acredita nela”, afirma o diretor.
As formas utilizadas pela ABCR são várias, entre elas campanhas como o próprio Dia de Doar e o incentivo à profissionalização dos captadores de recursos, como a indicação de vagas na área.
Vergueiro reconhece que o brasileiro doa mais no final do ano e, para ele, o Dia de Doar é um marco nessa época. Segundo o administrador, campanhas, comemorações e incentivos fiscais tornam dezembro um mês mais atrativo para a filantropia.
Quando se trata da doação mensal, Vergueiro recomenda que as campanhas de final de ano sejam uma forma de a organização fidelizar esse doador. “Toda organização deveria ter um programa de doação recorrente”.
Ele também deixa claro que as organizações devem aproveitar o período do fim do ano, mas tomando cuidado para não dependerem excessivamente das doações feitas nessa época. As OSCs devem usar essa época para aumentar o engajamento e conquistar novos doadores recorrentes para o próximo ano.