Filho de empregada doméstica, ele se tornou um famoso sociólogo
Florestan Fernandes (1920-1995) é considerado o patrono da sociologia brasileira. O sociólogo foi um importante defensor da escola pública e de estudos focados na realidade das classes mais pobres e oprimidas
Foto: Arquivo/Câmara dos Deputados (esq.) | Domínio Público (dir.)Por: Mariana Lima
Nascido na cidade de São Paulo em 22 de julho de 1920, Florestan Fernandes cresceu em cortiços no bairro do Bixiga, conhecidos pela sua população de imigrantes italianos.
Florestan foi criado pela mãe, que era empregada doméstica, e nunca chegou a conhecer o pai. Teve que começar a trabalhar aos 6 anos de idade como engraxate, e em sua adolescência trabalhou como garçom.
Estudou até o 3º ano do 1º Grau, hoje conhecido como o Ensino Fundamental I. Só retornaria aos estudos anos mais tarde, e não pararia mais.
Vale ressaltar que, apesar da origem humilde, Florestan contou com o incentivo da madrinha Hermínia Bresser de Lima, de família abastada, que era amiga de sua mãe.
Em 1941, iniciou os estudos no curso de Ciências Sociais na Universidade de São Paulo (USP). Em seu doutorado na mesma instituição e no mestrado na Escola Livre de Sociologia e Política, Florestan investigou os indígenas Tupinambá.
Quatro anos depois de ingressar na USP, em 1945, começou sua carreira como professor assistente na disciplina Sociologia 2. Neste período, sua relação com a militância ficou mais forte.
Dividindo-se entre a universidade e a militância no Partido Socialista Revolucionário, Florestan traduziu livros de Karl Marx ainda na década de 1940.
Na década de 1950, participou do famoso Projeto Unesco, que patrocinou diversos estudos sobre relações raciais no Brasil. Nesta época, engajou-se na defesa da escola pública, tornando-se alvo da ditadura militar.
Desta forma, acabou sendo preso após o Golpe Militar de 1964 e, em 1968, foi obrigado a se aposentar de sua carreira acadêmica e se exilar no Canadá e nos Estados Unidos, em consequência do Ato Institucional 5 (AI-5).
Só retornou para o Brasil em 1978, um ano antes da Lei da Anistia ser sancionada. Após o seu retorno, foi acolhido pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Na década de 1980, o sociólogo acompanhou de perto a formação do Partido dos Trabalhadores (PT) e do Movimento dos Trabalhadores e do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
Concorreu e foi eleito como deputado federal entre 1987 e 1995, tendo atuado na Assembleia Constituinte (1987 – 1988), dedicando-se à defesa da educação pública, na época advogando por ações afirmativas nas universidades, que só seriam implementadas anos depois.
Florestan é autor de mais de 50 livros, entre eles ‘Fundamentos empíricos da explicação sociológica’ (1959) e ‘O que é revolução?’ (1981), inaugurando uma tradição teórica na sociologia, observando a realidade a partir das classes mais baixas, ou seja, da perspectiva do oprimido e não do opressor.
Trabalhando com essa perspectiva, Florestan popularizou a prática de uma análise sociológica baseada no fundamento empírico, na busca por investigar a verdade por meio do trabalho de campo, ouvindo o que a favela ou a periferia tinham a dizer.
O sociólogo continua presente nos trabalhos das novas gerações de intelectuais que se comprometem com a transformação social do país, uma vez que os assuntos abordados em suas obras continuam atuais, como a democracia, desigualdade e relações raciais na sociedade brasileira.
Além da biblioteca na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, Florestan Fernandes dá nome ao assentamento rural em Florestópolis, instituto em Fortaleza, a uma fundação em Diadema, e a uma escola estadual em Perus, na capital paulista.
Em vida, Florestan chegou a receber o Prêmio Jabuti, em 1964, pelo livro ‘Corpo e alma do Brasil’, e foi agraciado após a sua morte, em 1995, aos 75 anos, causada por problemas do fígado, com o Prêmio Anísio Teixeira (1996), que é entregue a personalidades brasileiras que tenham contribuído para o desenvolvimento da pesquisa e formação de recursos humanos no país.
Em 24 de julho de 2006, Florestan Fernandes foi declarado patrono da Sociologia brasileira por meio da Lei Nº 11.325, assinada pelo então presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva.
Fonte:
SAYURI, Juliana. “Quem foi Florestan Fernandes, sociólogo que inspira acadêmicos até hoje“. Publicado pelo TAB UOL em 22 de julho de 2020.