Bicicletas mudam vidas
Em junho de 2012, resolvi comprar uma bicicleta e minha vida mudou. Naquela época, com 41 anos de idade, já havia percebido que usar automóvel para deslocamentos na cidade me causava stress e consumia fatia considerável dos meus rendimentos como jornalista. E olha que já fui um aficionado por automóveis, fã do Ayrton Senna e leitor da revista Quatro Rodas.
No início tive dificuldades, pois apesar de ser um corredor amador, os preparos físico e emocional de um ciclista são totalmente diferentes. Outros músculos e tendões a serem acionados, novos processos mentais para manter-se em equilíbrio e economizar energia.
Comecei com passeios aos finais de semana. Reunia-me com amigos e saíamos aos domingos, logo cedo, para jornadas pela cidade. A primeira expedição foi ao Pico do Jaraguá, saindo aqui do Rio Pequeno em um domingo frio e garoento. Para um iniciante era uma aventura. Andar pela Marginal do Tietê e Rodovia Anhanguera; nunca havia feito!
Acompanhar os colegas mais experientes era difícil. Estava sempre no fim da fila, mas não ligava, pois a exemplo das provas de corrida de rua, trabalhava meu cérebro para manter-me no meu ritmo mais confortável com o objetivo de chegar inteiro ao destino e guardar forças para a volta.
No furor da novidade, empreendemos meia dúzia de viagens para Santos. Cheguei a me embrenhar num matagal para conseguir descer pela Estrada Velha e enfrentar seis horas de chuva numa jornada com passagens pela Ilha do Bororé, no meio da Represa Guarapiranga e três quilômetros no acostamento da contramão na interligação das rodovias Imigrantes e Anchieta. Chovia forte, estava frio e o tráfego pesado da rodovia tornava tudo mais difícil.
Com essa prova decidi que poderia fazer de tudo em cima da bicicleta. Afinal tinha chegado a Santos inteiro, tanto emocional quanto fisicamente e devidamente aquecido. O planejamento da jornada fora um sucesso. Se eu podia chegar seco em Santos, depois de seis horas de chuva, ir ao escritório no bairro de Pinheiros não traria desconforto. Porém, adotar a bicicleta como principal transporte na cidade de São Paulo envolve uma verdadeira mudança de mentalidade.
Com a inauguração da ciclovia da Avenida Brigadeiro Faria Lima, onde trabalhava naquela época, passei a ir duas vezes por semana ao trabalho de bicicleta e em pouco tempo já me deslocava diariamente. Passei a economizar, de saída, 600 reais referentes ao custo com estacionamento e gasolina. Conseguia levar a bicicleta no elevador do prédio e me trocava no banheiro. Com a prática, a calça e a camisa não amassavam mais. Um colega de serviço explanou certa vez: “ainda não entendo como suas camisas nunca estão amarrotadas”.
Atualmente só uso o carro quando ando com a família. Se estou muito cansado ou a chuva é torrencial, excepcionalmente, vou de ônibus ou peço carona. Mas pode ocorrer de colocar minha dobrável no porta malas a depender do benefício. E tenho sempre que me informar com antecedência se meu destino possui lugar seguro para deixar a magrela e estar online com a previsão do tempo.
Passei então a ser um defensor do transporte de bicicleta. Em 2014, me filiei à Ciclocidade – Associação dos Ciclistas Urbanos de São Paulo. É a principal ONG voltada para o transporte em bicicletas. Não me considero um ativista e prefiro ser chamado de realista, pois é fato que a cidade só tem a ganhar caso consiga aumentar o número de ciclistas. E quem pedala possui um envolvimento mais humano com os conterrâneos. Creio no aprendizado holístico, no qual todas as correntes contribuem para uma convivência social mais pacífica.
Sobre Rogério Viduedo
Jornalista formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em 1996, Rogério Viduedo começou a carreira como repórter do jornal Primeira Hora de Osasco em 1993 e tem passagens pela agência Dinheiro Vivo e Editora Banas. Foi colaborador do jornal Valor Econômico e outras publicações voltadas à economia. Nos últimos dez anos, dedicou-se à comunicação corporativa de grandes empresas. Começou a pedalar em 2012 e desde então passou a se locomover por São Paulo de bicicleta.