O Terceiro Setor e as políticas públicas
Evento realizado pela Consultoria Júnior Pública da FGV reuniu personalidades e organizações para debater o tema, procurando estreitar relação entre setores
Na tentativa de promover um diálogo entre o Primeiro Setor, composto pelos órgãos públicos, e o Terceiro Setor, composto pelas organizações da sociedade civil, a Consultoria Júnior Pública da Faculdade Getúlio Vargas realizou o evento ‘Diálogo Entre Setores’, no dia 23 de maio. O foco desta primeira edição foi o debate de como as entidades sociais podem ajudar na criação das políticas públicas.
Por que existem as ONGs
Um dos primeiros pontos discutidos foi o porquê de um país necessitar de organizações da sociedade civil. E a resposta é: o poder público não consegue dar conta de todas as necessidades básicas da população.
Apesar dessa importância, segundo Josenir Teixeira, advogado e vice-presidente do Instituto Brasileiro de Advogados do Terceiro Setor, grande parte da sociedade tem uma visão equivocada sobre essas entidades. Muitas delas são vistas como facilitadoras de corrupção, como ferramentas para desviar dinheiro público, quando, na verdade, no Brasil houve apenas três investigações de lavagem de dinheiro público nas entidades, as chamadas CPIs das ONGs. Nestas CPIs, foram analisadas apenas 18 instituições das 290 mil existentes, sem nenhuma conclusão exata sobre a corrupção no terceiro setor.
Políticas públicas x neoliberalismo
Em sua palestra, Silvio Caccia Bava, editor-chefe do jornal Le Monde Diplomatique, fez uma comparação com a década de 1980, quando a mobilização por direitos básicos era reprimida pela ditadura. Com a Constituição de 1988, a Constituição Cidadã, houve um sentimento de melhora no cenário brasileiro, até que se iniciou a política Neoliberal, que garante a mínima intervenção do Estado, prevalecendo a privatização.
Nessa situação, pontos se contrapõem: de um lado a luta pela defesa de direitos e as políticas públicas, de outro o neoliberalismo. As políticas públicas deveriam seguir quatro pontos essenciais: serem para todos, serem regulares, de qualidade e gratuitas. Mas não é assim que funciona.
Atualmente, o Sistema Único de Saúde utiliza apenas metade do recurso que deveria ter para ser de qualidade. Com isso, cabe muitas vezes ao Terceiro Setor atender diversas demandas na área da saúde.
Falta de planejamento
Elida Graziane, promotora do Ministério Público, destacou a falta de planejamento das entidades. “Uma sociedade que não planeja aceita qualquer resultado”, declarou. Os gestores das entidades não têm autonomia suficiente para colocar em prática seus planos.
Márcia Moussallem, cientista política, mestre e doutora em Serviços sociais, também falou sobre os problemas da falta de planejamento, e destacou que o Terceiro Setor precisa ter atitude, ir às ruas, manifestar e lutar pelo cumprimento da lei e dos direitos de cada um. “Trabalhar com questões públicas é defesa de direito”, disse. De acordo com ela, as organizações devem conhecer a própria constituição, as instâncias, a legislação, além de não enaltecer o neoliberalismo, pedindo mais intervenção do Estado, pois, como dito anteriormente, se o governo cumprisse e atendesse as necessidades básicas da população, as ONGs não precisariam existir.
Comunicação com o poder público
O evento contou também com uma roda de conversa entre organizações da sociedade civil que se relacionam diretamente com o Estado. Estavam presentes representantes da Associação Horizontes, da Fundação Salvador Arena, da Fundação Dorina Nowill para Cegos e do Instituto Inspirare, além de um representante da Pulso Público.
Nessa discussão, o principal assunto foi como as organizações comunicam-se com o governo, fazem-se presentes diante do estado na criação das políticas públicas e obtêm parcerias para captação de recursos.
Marcelo Rocha, da Associação Horizontes, mostrou as dificuldades do convênio com o governo, composto por licitações viciadas e suas conduções desastrosas, a insegurança financeira, a baixa qualificação dos agentes públicos, a prestação de contas instáveis, a redução da autonomia das Organizações da Sociedade Civil (OSCs), entre outras.
O representante da Fundação Salvador Arena, Sérgio Loyola, destacou que as instituições devem saber o seu papel social e que elas influenciam, sim, nas políticas públicas. E, seguindo a fala de Márcia Moussalem, Loyola falou da importância de as instituições cobrarem explicações e atitudes do governo.
Ana Paula Pereira, da Fundação Dorina, chamou a atenção para o fato de não haver um representante no parlamento, uma bancada ou um ministério que fale pelo Terceiro Setor. Esse “canal único” seria a melhor forma de presença das entidades perante o governo. Por outro lado, ela sabe que seria difícil alguém vinculado ao Poder Público admitir que o próprio Estado não consegue arcar com as dificuldades dos mais vulneráveis para, assim, abrir espaço e investir nas ONGs.
Um trabalho importante citado e discutido por Fábio Meirelles, do Instituto Inspirare e por Vitor Oliveira, da empresa Pulso Público, é o do advocacy, considerado o “lobby do bem”, que luta pela defesa dos direitos das entidades do Terceiro Setor, suprindo suas necessidades e tentado gerar maior autonomia.
“Como pauta, o Terceiro Setor surge de uma concepção de que a sociedade civil é organizada e tem que complementar os serviços do Estado, que não consegue resolver tudo. Mas nem o Terceiro Setor consegue resolver tudo, nem o Estado é tão limitado. Então, uma valorização do Terceiro Setor seria começar a contribuir para que o Estado assuma políticas universais de qualidade e garanta os direitos da constituição para todo brasileiro”, disse Silvio Caccia Bava, exclusivamente para o Observatório do Terceiro Setor.
O evento
Márcia Moussalem destacou a importância do debate: “Esse evento é fundamental para a universidade abrir as portas chamando as organizações, os alunos e todos os atores do meio para essa discussão”.
Clara Limongi e Alexandre, ambos estudantes e participantes da Consultoria Júnior Pública da FGV, foram os idealizadores do evento. “Esse é o primeiro evento e nós esperamos fazer um a cada semestre. A ideia surgiu de juntar os dois lados, o de projetos e o Terceiro Setor, aproximando os setores da FGV”, disse Alexandre.
Carlos Magno Alexandre
27/05/2016 @ 02:56
Parabéns pelas propostas,um novo olhar sobre o direito e cidadania,a não intervenção do Estado nas causa ditas públicas,uma melhor fiscalização da ação do ESTADO no que serve de supostos direitos aos cidadãos brasileiros, Ja’ que se cobra tão caro os bens e serviços,quando temos e Vivemos com uma carga tributária tão criminosa,que em nada favorece ao cidadão brasileiro. Alexandre!