Agrotóxico mais usado no Brasil está associado a 503 mortes de crianças por ano
Muito usado na produção de soja transgênica, o glifosato é o agrotóxico mais popular do Brasil. Mas pode ter um alto custo humano: de acordo com pesquisadores da Universidade de Princeton, da FGV e do Insper, ele aumentou a mortalidade infantil em municípios do Sul e Centro-Oeste do país
O glifosato é o agrotóxico mais usado do Brasil. Ele representa 62% do total de herbicidas usados no país e, em 2016, as vendas desse produto químico em milhares de toneladas foi superior à soma dos sete outros pesticidas mais comercializados em território nacional.
Associado à produção de soja transgênica, o herbicida contribuiu para que o Brasil se tornasse o maior produtor do grão no mundo, superando os Estados Unidos.
Um estudo realizado por pesquisadores da Universidade de Princeton, da Fundação Getulio Vargas (FGV) e do Insper revela que essa geração de riqueza tem um alto custo: segundo o levantamento, a disseminação do glifosato nas lavouras de soja levou a uma alta de 5% na mortalidade infantil em municípios do Sul e Centro-Oeste que recebem água de regiões sojicultoras.
Isso representa um total de 503 mortes de crianças a mais por ano associadas ao uso do glifosato na agricultura de soja.
“Há uma preocupação muito grande quanto aos efeitos dos herbicidas sobre populações que não são diretamente envolvidas com a agricultura, que não estão diretamente expostas aos agrotóxicos“, observa Rodrigo Soares, professor titular da Cátedra Fundação Lemann do Insper e um dos autores do estudo, ao lado de Mateus Dias (Princeton) e Rudi Rocha (FGV).
“Apesar dessas substâncias estarem presentes no corpo de mais de 50% da população ocidental, não sabemos se isso é danoso ou não”, acrescenta o pesquisador.
Na União Europeia, desde 2015, há um amplo debate sobre a possibilidade de proibição do uso do glifosato, após um relatório da Agência Internacional de Pesquisa em Câncer (Iarc, na sigla em inglês) daquele ano ter classificado a substância como “provável carcinógeno humano”, ou seja, como possível agente causador de câncer.
Nos Estados Unidos, a Bayer já desembolsou bilhões de dólares em acordos para encerrar processos judiciais quanto a acusações de que o glifosato provoca câncer.
“Na União Europeia, ao contrário do Brasil, o registro dos agrotóxicos sempre tem um tempo determinado. Aqui, quando um agrotóxico é registrado, esse registro é eterno, até que ele eventualmente venha a ser questionado”, explica Alan Tygel, membro da coordenação nacional da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e Pela Vida.
Na Europa, atualmente, a autorização do uso do glifosato vale até dezembro de 2022. A Áustria se tornou o primeiro país da região a banir o produto, em 2019, enquanto a Alemanha planeja prescindir do herbicida a partir de 2024.
Segundo os pesquisadores, o objetivo do estudo não é “demonizar” o glifosato, mas contribuir para uma melhora das políticas públicas de regulação do uso dos agrotóxicos no país.
Fonte: BBC Brasil