Cultura de Paz: a importância do “desarmar”
Em toda a história do país, esse é o momento em que existem mais armas nas mãos dos cidadãos. Em 2021, 76% dos casos de mortes violentas ocorreram por arma de fogo. Em tempos tão difíceis, especialistas falam sobre a necessidade de uma Cultura de Paz no Brasil e no mundo
Por Iara de Andrade
Em toda a história do país, esse é o momento em que existem mais armas nas mãos dos cidadãos. Desde o início de 2019, cerca de 30 normas voltadas à facilitação da posse, do porte e do aumento na quantidade de armas e munições para o cidadão comum foram assinadas pelo governo federal.
A Polícia Federal recebeu 320 mil novos registros de armas entre 2019 e 2020; no período de 2012 a 2018, foram 303 mil. Ao passo, que, entre os anos de 2015 e 2020, o país perdeu quase 800 bibliotecas públicas, enquanto ganhou um clube de tiro por dia.
O ano passado contabilizou 47.503 mortes violentas intencionais. Em 76% dos casos, foram provocadas por armas de fogo. Em tempos tão difíceis, estamos tentando construir caminhos para uma Cultura de Paz, para o desarmar.
A Cultura de Paz
A noção de Cultura de Paz é trabalhada pela Organização das Nações Unidas para a Educação e Ciência (UNESCO), como um conjunto de valores, atitudes, tradições, comportamentos e estilos de vida baseados na tolerância, na solidariedade, na paz e na harmonia. A partir disso, a Cultura de Paz se faz necessária para que consigamos, enquanto sociedade, resolver os conflitos de forma não-violenta e garantir que todos os cidadãos, sem exceção, sejam respeitados.
Em entrevista para o Observatório do Terceiro Setor, Giane Silvestre, pesquisadora de pós-doutorado do Núcleo de Estudos da Violência da Universidade de São Paulo (NEV USP), explica que conflitos são inerentes às sociedades e podem ser muito produtivos, mas a resolução pacífica deles ainda não é uma realidade brasileira:
“Não temos instituições de segurança e de justiça que trabalham preconizando a Cultura de Paz. O acesso à justiça ainda é muito desigual no Brasil. Quem tem acesso, tanto aos tribunais superiores, quanto às primeiras instâncias, são pessoas mais abastadas, que têm seus direitos resguardados”.
Nesse sentido, é preciso que haja um fortalecimento das instituições, sobretudo daquelas que tratam de segurança e justiça. O sociólogo e professor Livre Docente no Departamento de Sociologia da Universidade de São Paulo, Marcos César Alvarez, menciona que, com frequência, o próprio Estado acaba empregando violência arbitrária e ilegítima.
“Toda sociedade precisa controlar a violência para garantir sua existência. Sociedades como as nossas têm, ainda, como ideal, integrar plenamente todos os indivíduos na vida social, ou seja, permitir que todos participem da riqueza material e simbólica da sociedade. Se a paz e a inclusão não são colocadas como valores essenciais da vida social, a violência pode encontrar mais espaço de realização”, pontuou sobre a necessidade da Cultura de Paz.