Retrocesso? Há um século, Brasil barrava Copa América para conter pandemia
Em meados de outubro de 1918, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD) enviou um telegrama à Conmebol para comunicar que não havia condições de sediar o campeonato naquele período, em razão da explosão de casos de gripe espanhola
O Brasil enfrenta a pandemia de covid-19 com uma vacinação lenta, mais de 465 mil mortes e regiões nas quais especialistas apontam que os casos da doença têm aumentado nas últimas semanas. Apesar do atual cenário, a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) anunciou na segunda-feira (31/05) que o Brasil sediará a Copa América deste ano.
Segundo a Conmebol, o presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), Rogério Caboclo, foi procurado pela confederação após os outros países desistirem de sediar a competição.
Em meados de outubro de 1918, a recém-criada Confederação Brasileira de Desportos (CBD) enviou um telegrama à Conmebol para comunicar que não havia condições de sediar o campeonato naquele período, em razão da explosão de casos de gripe espanhola no Rio de Janeiro e da orientação para suspender eventos públicos.
“Os principais entretenimentos, como cinema e teatro, e as escolas estavam fechados por causa da pandemia. Os campeonatos locais estavam suspensos. A situação estava muito complicada, então não havia cabimento continuar com o Sul-Americano”, detalha João Manuel Casquinha, professor do Departamento de História da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e pesquisador sobre a história do esporte no Brasil.
Dados da época apontam que o Rio de Janeiro contabilizou cerca de 15 mil óbitos entre setembro e novembro de 1918.
Um século depois e com mais de 465 mil mortos pela covid-19, o país adotou uma postura totalmente diferente. Mesmo sendo um dos países com mais mortes no mundo, e com a vacinação atrasada, aceitou o convite para sediar a competição. Outros países vizinhos como Bolívia e Argentina adotaram a mesma postura coerente do Brasil de um século atrás e negaram sediar a competição durante a pandemia.
Miguel Nicolelis, professor de Neurociência da Universidade de Duke, nos Estados Unidos, afirmou que a realização da disputa no Brasil pode ser a “gota d’água” para a terceira onda de casos e mortes pela covid-19 no país.
Nicolelis definiu que o anúncio do Brasil como sede do campeonato é um “chute na boca dos brasileiros que perderam familiares, de todos nós que estamos há 14 meses em quarentena em casa. Mas era previsível”.
“Nós viramos o escoadouro do lixo do planeta. Tudo que não deve ser feito em questão de pandemia está sendo feito aqui. Essa notícia já correu o mundo, e ninguém consegue acreditar que o segundo país em número de mortes vai sediar um evento continental”, finalizou.
Fonte: BBC Brasil