Inocentes: 100 crianças foram baleadas em 5 anos no Rio de Janeiro
Em 2019, último ano escolar convencional antes da pandemia, 32% dos tiroteios na região metropolitana do Rio ocorreram no entorno de escolas
Rafael, Endryw, Ana Clara, Alice e Kaio. Estas são as crianças baleadas na Grande Rio de Janeiro somente neste ano. Há mais uma, cujo nome e foto não foram divulgados. São seis das 100 crianças baleadas nos últimos cinco anos na região metropolitana do Rio.
Kaio, de 8 anos, foi atingido por uma bala perdida no dia 16 deste mês. Foi operado de emergência e ficou internado no Hospital Municipal Pedro II. Passados 9 dias, não resistiu aos ferimentos e morreu no sábado, 25. Na última terça-feira (27/04), foi enterrado na presença de outras crianças como ele.
Kaio era filho único, e vivia com os pais na Zona Oeste do Rio. Na sexta, 16, estava numa festa num centro de reforço escolar. Sua mãe, Thais Silva, estava com ele no local. O menino esperava numa fila para pintar o rosto quando foi atingido na cabeça pela bala perdida, possivelmente de um tiroteio perto dali. Quando viu o sangue do filho no chão, Thais não conseguiu reagir, só chorar. “Não conseguia nem segurar meu filho”, disse ela, segundo relatam jornais cariocas.
Outras três crianças baleadas nestes 5 anos foram alvejadas na escola ou a caminho dela. Mais 17 foram atingidas em casa, de acordo com dados do Instituto Fogo Cruzado, plataforma digital que registra dados de violência em ambientes que deveriam ser ilhas de segurança para crianças, no entanto, não o são no Rio de Janeiro, um estrato do Brasil onde nascer na periferia não segue as estatísticas naturais de um ciclo de vida.
“Uma vida de criança perdida é menos um presente e menos um futuro para todos nós”, diz Pedro Hartung, advogado e coordenador jurídico do Instituto Alana, que promove o direito e o desenvolvimento integral da criança no Brasil.
Em 2019, último ano escolar convencional antes da pandemia, 32% dos tiroteios na Grande Rio ocorreram no entorno de escolas. A grave situação fez com que a Defensoria Pública entrasse com uma Ação Civil Pública para proibir ações policiais perto de creches e escolas e que helicópteros da polícia, também conhecidos como “caveirões aéreos”, mantivessem distância dos prédios.
O Ministério Público também se moveu e emitiu uma recomendação para que fosse estabelecido um sistema de notificação compulsória para as escolas da rede municipal de ensino em casos de tiroteios nas imediações das unidades.
O Nobel de Economia James Heckman concluiu em um de seus estudos que o investimento na primeira infância (de zero a 5 anos) é uma estratégia eficaz para o crescimento econômico. Ele calculou que, para cada dólar gasto, o retorno financeiro para a sociedade é de seis dólares. Segundo Heckman, o retorno sobre o investimento é de 7 a 10% ao ano.
Em 2020, o Governo do Rio foi condenado a indenizar 81 pessoas por erros, crimes ou má conduta de policiais. O valor médio foi de pouco mais de 100 mil reais, o que equivale a cerca de 100 salários mínimos. Para comparação, a soma do valor pago para todas estas vítimas não equivale a 5% da indenização paga para a família de George Floyd, homem negro sufocado até a morte por um policial branco, nos EUA, no ano passado.
Fonte: El País