Novos surtos de malária ocorrem entre povos indígenas na Amazônia
Casos estão conectados a exploração de ouro, desmatamento e mineração na Amazônia, podendo desencadear surtos mais graves em 2020
Por: Mariana Lima
Após as queimadas nas florestas, enxames de mosquitos surgem. Quando ateiam fogo nas árvores, os garimpeiros escavam minas profundas na área desmatada para extrair ouro.
Boa parte destas escavações invade terras protegidas que ficam próximas das regiões queimadas, destruindo ainda mais a cobertura florestal da qual diversas pessoas dependem para sobreviver.
Essas crateras, que se assemelham ao formato de cavernas, enchem-se de água que fica parada depois que as minas são abandonadas.
É desta forma que as doenças transmitidas por mosquitos, como a malária, começam a se propagar com mais facilidade.
A relação entre o desmatamento e doenças chamou atenção de especialistas da Amazônia e moradores locais este ano.
Com o preço do ouro em alta, a exploração ilegal dele, feita geralmente em áreas de conservação e terras indígenas, provavelmente deixará a Amazônia repleta de criadouros, que favorecem a reprodução de mosquitos. Pode vir, assim, mais uma crise de saúde pública para controlar.
É importante salientar que qualquer ocorrência de desmatamento pode aumentar a taxa de disseminação de doenças transmitidas por mosquitos.
Os estragos do ouro
Somente entre 2017 e 2019, a extração de ouro destruiu 10,2 mil hectares de terra em três territórios indígenas – Munduruku, Ianomâmi e Caiapó – localizados na Amazônia Legal, de acordo com a ONG Amazon Conservation.
A Amazônia Legal inclui todos os nove estados da bacia amazônica e foi criada pelo governo brasileiro em 1948 para ajudar a planejar o desenvolvimento econômico e social da região.
Nas terras munduruku, o desmatamento causado pela exploração de ouro mais que dobrou entre 2018 e 2019, destruindo dois mil hectares no ano passado.
A perda de árvores permanece em 2020 e se estende para além dessas terras indígenas. No total, o desmatamento na Amazônia aumentou 25% no primeiro semestre deste ano, de acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe).
Além disso, o Instituto do Homem e Meio ambiente da Amazônia constatou que 43% desse desmatamento ocorreu no estado do Pará, na região norte do país.
Em junho, mês que marca o início da estação seca na Amazônia, época em que os incêndios se espalham com facilidade, 22% do desmatamento da Amazônia Legal ocorre em áreas de conservação e 3% em terras indígenas.
O governo do Pará afirma que a taxa de transmissão de malária em áreas de mineração aumentou 17,8% no primeiro semestre de 2020. Mas pode ser maior, uma vez que muitos caos não são notificados.
No quadro geral, as doenças transmitidas por mosquitos aumentaram 32% na região de Itaituba em comparação com o mesmo período de 2019. Já nas terras indígenas localizadas no estado, esse aumento foi de 46,7%.
Os obstáculos do sistema de saúde
Dentro deste cenário, o uso de redes mosquiteiras e outras medidas preventivas praticamente não existem e, embora o Brasil conte com o Sistema Único de Saúde (SUS), o acesso ao atendimento médico em áreas remotas da Amazônia é praticamente impossível.
Mesmo se houvesse clínicas ou hospitais próximos, os garimpeiros provavelmente não buscariam o tratamento médico devido ao caráter ilegal de seu trabalho.
A maioria dos garimpeiros desconhece as medias de prevenção e tratamento, e acaba se automedicando, tomando uma dose mais baixa do medicamento.
Desta forma, eles permanecem infectados por vários dias ou tomam remédios antimaláricos para qualquer febre que eventualmente tenham.
A movimentação deste grupo pela floresta faz com que a malária também circule. A transmissão da doença não ocorre de pessoa para pessoa.
Contudo, se o mosquito picar uma pessoa já infectada com malária, ele pode carregar o parasita que causa a doença e transmiti-lo a outras pessoas.
A doença pode ser transmitida para as pessoas que moram nas cidades onde os garimpeiros residem e, eventualmente, retornam, ou para os indígenas que vivem nas regiões próximas da Amazônia.
Fonte: National Geographic Brasil