O jubileu de prata da Lei do Serviço Voluntário no Brasil
Na década de 90, Miguel Darcy de Oliveira, membro do Comitê Executivo do Conselho da Comunidade Solidária e coordenador do Programa Voluntários da Comunidade Solidária, refletiu sobre os princípios para quem queria ser voluntário, descomplicando e convidando todos para o voluntariado:
- Todos podem ser voluntários
2. Voluntariado é uma relação humana, rica e solidária
3. Trabalho voluntário é uma via de mão dupla
4. Voluntariado é ação
5. Voluntariado é escolha
6. Cada um é voluntário a seu modo
7. Voluntariado é compromisso
8. Voluntariado é uma ação duradoura e com qualidade
9. Voluntariado é uma ferramenta de inclusão social
10. Voluntariado é um hábito do coração e uma virtude cívica.
Tantos anos depois e essas dicas seguem atuais e relevantes. Foi esse mesmo Conselho que em 1997 definiu que voluntário é o “cidadão que, motivado pelos valores de participação e solidariedade, doa seu tempo, trabalho e talento, de maneira espontânea e não remunerada, para causas de interesse social e comunitário”.
E nessa década aconteceu um grande movimento para a participação da sociedade civil em projetos sociais, um destaque para a Ação da Cidadania Contra a Fome e a Miséria e pela Vida, organizada pelo sociólogo Herbert de Souza em 1993 com o objetivo de combater a fome. Também foram criados os Centros de Voluntariado do Brasil fomentando serviço voluntário em todas as regiões do país. Tempos de celebração da democracia, de acolhimento da constituição cidadã, da participação cívica de todos os indivíduos, para a construção de uma sociedade mais justa, de buscar e promover a garantia de direitos para todos. O voluntariado passou a ser ainda mais divulgado como uma estratégia e uma ferramenta para esse engajamento.
Se por um lado havia um grande chamamento para a participação dos indivíduos, havia a carência de organizar e profissionalizar os espaços e projetos que recebiam os voluntários, e ainda estruturar formas de reconhecer a dedicação para promover ainda mais envolvimento e contribuição. Como exigir pontualidade, compromisso, sem caracterizar uma relação de emprego? Como garantir a coordenação e a gestão sem um amparo legal? Como normatizar sem nenhum instrumento jurídico? Como estimular a prática do voluntariado, facilitar o gerenciamento dos voluntários, mas ao mesmo tempo evitar inseguranças e riscos?
A resposta para todas essas questões veio depois de um longo e dedicado debate com a promulgação, em 18 de fevereiro de 1998 da Lei 9608 que regulamenta o Serviço Voluntário no Brasil. Foi sem dúvida um avanço protegendo as organizações sociais de questões na justiça trabalhista e facilitando os canais e projetos de incentivo e convite ao voluntariado.
Apesar de estarmos comemorando o jubileu de prata, isto é, os 25 anos da promulgação da lei do voluntariado no Brasil, segundo a pesquisa com o perfil do voluntariado brasileiro, apenas 45% dos voluntários tem conhecimento sobre os aspectos jurídicos do voluntariado. Vamos conhecer um pouco mais e explorar cada um dos cinco artigos da Lei 9.608, que foi atualizada em 16 de junho de 2016.
O primeiro artigo apresenta um alinhamento sobre o conceito de voluntariado, reforça a ausência de vínculo trabalhista da atividade. Na definição das Nações Unidas, “voluntário é o jovem ou o adulto que, devido a seu interesse pessoal e ao seu espírito cívico, dedica parte do seu tempo, sem remuneração alguma, a diversas formas de atividades, organizadas ou não, de bem estar social, ou outros campos.” O voluntariado é a relação que se estabelece na prática de uma atividade não remunerada com o objetivo de contribuir para a comunidade, para as pessoas que fazem parte dela buscando um bem comum. Neste artigo da lei, claramente se afasta o vínculo criado por meio do serviço voluntário de qualquer outra relação de trabalho. Apesar da habitualidade, do compromisso e da gestão, o artigo reforça gratuidade ou seja, a não remuneração. Também descreve onde as ações podem acontecer e quais os objetivos que, por meio da atividade voluntária, se pretende atender.
Foi este artigo que sofreu a alteração em 2016, ampliando a possibilidade de atuação. Segundo um dos redatores da atualização da Lei, o senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA) “o trabalho voluntário é uma ótima oportunidade de atuação social, beneficiando toda a sociedade. O voluntário exerce a sua cidadania, ao mesmo tempo em que contribui para o bem-estar da comunidade como um todo e é altamente louvável qualquer tentativa de ampliar o espectro da atuação do serviço voluntário.” Fonte: Agência Senado
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Art. 1º Considera-se serviço voluntário, para os fins desta Lei, a atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou a instituição privada de fins não lucrativos que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência à pessoa. (Redação dada pela Lei nº 13.297, de 2016).
Parágrafo único. O serviço voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista previdenciária ou afim.
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O segundo artigo apresenta a obrigatoriedade de oficializar o compromisso assumido entre o voluntário e o responsável pelo programa de voluntariado por meio da assinatura de um documento, o Termo de Adesão ao Serviço Voluntário. Esse documento deve conter informações sobre o voluntário, quando e quantas horas serão doadas, a atividade que será realizada, onde ela acontece, e ainda em que condições. O documento é exigência da lei e formaliza essa relação, devendo ser arquivado e guardado, como um comprovante da ausência de vínculo trabalhista.
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Art. 2º O serviço voluntário será exercido mediante a celebração de termo de adesão entre a entidade, pública ou privada, e o prestador do serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.
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No terceiro artigo é apresentada a possibilidade de uma autorização para o ressarcimento de despesas efetuadas pelo voluntário no exercício de suas atividades, desde que previamente autorizadas pelo responsável pelo programa de voluntariado. Importante ressaltar que o voluntário jamais recebe pela atividade que realiza (a lei 9608 deixa muito clara a gratuidade da atividade voluntária), mas o voluntário, desde que expressamente combinado e formalizado, pode ser reembolsado por despesas que tenha para efetuar suas ações, tais como materiais que ele utilize, deslocamento e alimentação.
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Art. 3º O prestador do serviço voluntário poderá ser ressarcido pelas despesas que comprovadamente realizar no desempenho das atividades voluntárias.
Parágrafo único. As despesas a serem ressarcidas deverão estar expressamente autorizadas pela entidade a que for prestado o serviço voluntário.
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Por fim os artigos quatro e cinco apontam a data e a validação da lei, ou seja, determinações anteriores e contrárias ao que dispõe a lei atual estão abolidas.
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Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.
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Comemorar os 25 anos da Lei do Serviço Voluntário no Brasil é celebrar e festejar o voluntariado, e entender esse instrumento jurídico como uma forma de reconhecer, aclamar e agradecer os 57 milhões de brasileiros voluntários!
Presidência da República – Casa Civil – Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI Nº 9.608, DE 18 DE FEVEREIRO DE 1998
Dispõe sobre o serviço voluntário e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1º Considera-se serviço voluntário, para os fins desta Lei, a atividade não remunerada prestada por pessoa física a entidade pública de qualquer natureza ou a instituição privada de fins não lucrativos que tenha objetivos cívicos, culturais, educacionais, científicos, recreativos ou de assistência à pessoa. (Redação dada pela Lei nº 13.297, de 2016)
Parágrafo único. O serviço voluntário não gera vínculo empregatício, nem obrigação de natureza trabalhista previdenciária ou afim.
Art. 2º O serviço voluntário será exercido mediante a celebração de termo de adesão entre a entidade, pública ou privada, e o prestador do serviço voluntário, dele devendo constar o objeto e as condições de seu exercício.
Art. 3º O prestador do serviço voluntário poderá ser ressarcido pelas despesas que comprovadamente realizar no desempenho das atividades voluntárias. Parágrafo único. As despesas a serem ressarcidas deverão estar expressamente autorizadas pela entidade a que for prestado o serviço voluntário.
Art. 3o-A. (Revogado pela Lei nº 11.692, de 2008) Art. 4º Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 5º Revogam-se as disposições em contrário.
Brasília, 18 de fevereiro de 1998; 177º da Independência e 110º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Paulo Paiva
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*A opinião dos colunistas não reflete, necessariamente, a opinião do Observatório do Terceiro Setor.