Projetos fortalecem autoestima de mulheres que tiveram câncer de mama
Alguns tratamentos indicados para combater o câncer de mama podem afetar de forma direta a autoestima e a autoconfiança das mulheres
Por: Júlia Pereira
De acordo com o Instituto Nacional de Câncer (INCA), o câncer de mama é a doença oncológica que mais acomete as mulheres no Brasil – excluído o câncer de pele não melanoma. Os homens também são afetados pela doença, mas em menores proporções: um homem para cada 100 mulheres.
“Infelizmente, no Brasil, nós temos feito o diagnóstico do câncer de mama tardiamente. Isso piora muito o prognóstico da paciente, piora muito as chances de tratamento, dificulta muito mais e acaba sendo, inclusive, um tratamento muito mais oneroso para o Estado pela situação em que a paciente se encontra”, afirma Angela Francisca Trinconi, médica mastologista do Instituto do Câncer do Estado de São Paulo (Icesp).
O mês de outubro é conhecido como o período de campanha de conscientização sobre o câncer de mama e tem como principal objetivo alertar a sociedade e, principalmente as mulheres, sobre a importância da prevenção.
“No Outubro Rosa, queremos chamar a atenção exatamente para esse diagnóstico mais precoce. Quanto mais precoce, mais fácil vai ser o tratamento, maior a probabilidade de cura e menor o gasto do Estado com essas pacientes”, lembra a médica.
A prevenção deve ser feita tanto de forma individual, quando a mulher presta atenção aos sinais do próprio corpo para tentar identificar mudanças, quanto por meio da realização periódica de consultas e exames, que apresentaram quedas durante a pandemia.
O número de mamografias realizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) caiu entre os meses de janeiro e julho deste ano em comparação com o mesmo período de anos anteriores. Até julho, o número de exames foi de 1,1 milhão, contra 2,1 milhões em 2018 e 2019.
O Ministério da Saúde explica que a pandemia foi o principal fator para a diminuição da procura pelo serviço, ainda que as unidades de saúde tenham mantido o atendimento e a oferta de tratamento às pacientes.
Os diagnósticos de câncer de mama também foram reduzidos no período. Segundo a mastologista, isso aconteceu porque houve limitação em centros hospitalares responsáveis pelo atendimento secundário ou terciário, ou seja, aqueles com especialistas que podem realizar a biópsia do tumor e fazer o diagnóstico.
“Isso não é o mais adequado, porque quanto mais precoce o diagnóstico, melhor o prognóstico da paciente. Não significa que nós vamos deixar de tratá-la, mas, em alguns casos, nós teremos um tratamento retardado por conta da pandemia”, ressalta a médica.
Além dos exames, outros fatores também merecem atenção, pois apresentam riscos e podem aumentar as chances de desenvolvimento da doença, como obesidade, ingestão de bebidas alcóolicas em grandes quantidades, sedentarismo e uso inadequado de terapias de reposição hormonal pós-menopausa. Os fatores genéticos também apresentam riscos, mas menores: a cada 10 pessoas diagnosticadas com câncer, apenas uma apresenta antecedente familiar.
“É transformar o momento em que você iria começar a ter maior chance de ter câncer na sua idade mais saudável. Em qualquer momento da vida, a gente pode modificar esses fatores, mas o importante é que venha desde sempre, que a gente já eduque as meninas, as moças, as jovens adultas e as mulheres mais maduras sempre, em todos os momentos da vida”, enfatiza a médica.
Caso a mulher seja diagnosticada com o câncer de mama, ela será submetida ao tratamento mais adequado para o seu estágio da doença, como a cirurgia para retirada total ou parcial da mama, quimioterapia, radioterapia, terapia hormonal ou terapia alvo.
Tais tratamentos podem ter efeitos no corpo da paciente. Porém, diversas iniciativas ajudam a amparar essas mulheres, e fortalecer a autoestima e a autoconfiança abaladas durante o enfrentamento do câncer de mama.
RECONSTRUÇÃO DA ARÉOLA
Atualmente, 70% dos casos de câncer de mama no Brasil são diagnosticados tardiamente, o que pode fazer com que a mulher seja submetida a um tratamento mais agressivo, como a mastectomia, ou seja, cirurgia que consiste na remoção da mama. Após o procedimento, a autoestima das mulheres pode ficar abalada, já que, em alguns casos, não é possível preservar a aréola e o mamilo.
Pensando nisso e no fortalecimento da autoestima de tais pacientes, há cerca de dois anos, a Natalia Beauty & Academy realiza o procedimento de reconstrução da aréola com micropigmentação para qualquer mulher que precisou recorrer à mastectomia por conta da doença. A ação é realizada de forma gratuita.
“O que me motivou foi justamente tentar fazer parte da trajetória delas no câncer de mama de uma forma positiva”, diz Natalia Martins, empresária no ramo da beleza e fundadora da Natalia Beauty & Academy.
Até o momento, já foram realizados mais de mil procedimentos de reconstrução da aréola, proporcionando um resultado real, artístico e de qualidade.
“Geralmente, elas chegam para fazer o procedimento um pouco tímidas, inseguras, acanhadas. A profissional vai conversando com elas, explicando que isso é muito comum, que muitas fazem, acalmando elas, mostrando empatia. No fim, elas saem outras mulheres, totalmente empoderadas”, conta a empresária.
A primeira etapa do processo consiste no esboço da aréola, conforme o tamanho mais adequado para a paciente. Depois disso, a profissional utiliza uma ferramenta, chamada dermógrafo, e várias cores que possibilitam a técnica de luz e sombra, o que causa o efeito tridimensional e deixa o resultado mais real. O procedimento leva em média 2 horas para ser feito.
“A importância dessa iniciativa é que a gente consegue incentivar outras pessoas em seus segmentos a terem iniciativas parecidas. Assim, a gente consegue gerar um movimento de empatia muito grande em vários setores, beneficiando a mulher que precisa de carinho, de cuidado, do que for preciso para que ela se sinta mais feliz e amenize um pouco do trauma da doença”, ressalta Natalia.
Foi assim que Fernanda Marcelo da Silva, de 49 anos, sentiu-se ao realizar o procedimento. Em 2018, ela precisou passar pela mastectomia e teve a autoestima muito abalada com a retirada da aréola.
Por meio das redes sociais, Fernanda conheceu o trabalho de reconstrução realizado de forma gratuita na Natalia Beauty & Academy. Entrou em contato e agendou o procedimento que, segundo ela, desde o início, é feito com muito carinho pela equipe.
“Após o procedimento, eu comecei a conseguir olhar um pouco melhor para os meus seios novamente, porque eu fiquei muito triste com tudo o que estava acontecendo e a gente não se enxerga mais como mulher. O procedimento, com certeza, levanta muito a autoestima feminina, e eu estou muito feliz com tudo o que foi realizado”, relata.
O procedimento de reconstrução da aréola na Natalia Beauty & Academy é realizado na matriz, em São Paulo, e pode ser agendado pelo telefone (11) 3061-2670.
DOAÇÃO DE PERUCAS
O apoio e troca de informações são fatores essenciais para que a mulher enfrente o tratamento do câncer de mama da maneira menos difícil possível. Diversas organizações possuem esse objetivo, como a Fundação Laço Rosa, que atua na linha de frente com iniciativas para mudar políticas públicas e transformar a realidade de pacientes com câncer de mama no Brasil e no mundo.
“Nós atuamos em algumas frentes de trabalho: no empoderamento de pacientes; na produção e na curadoria de informação segura sobre o câncer de mama; na influência de políticas públicas e no resgate da autoestima”, explica Marcelle Medeiros, presidente da organização.
Entre as iniciativas da Fundação Laço Rosa está o Banco de Perucas, que existe desde 2011 ajudando a resgatar a autoestima da mulher que passou pelo tratamento de câncer de mama. Até o momento, 8.340 pessoas já foram atendidas pelo programa.
“A gente entendeu que esse processo não tem nada a ver com beleza, ele tem a ver com identidade. E é exatamente isso que a gente faz, a gente resgata a identidade dessa mulher através da doação de perucas. O que a gente faz é simplesmente um acolhimento, é dizer para essa paciente: ‘É muito ruim você perder todos os pelos do seu corpo, mas vai passar”, detalha Marcelle.
Apesar de ter como foco o atendimento de mulheres que passaram pelo tratamento do câncer de mama, o Banco de Perucas da Fundação Laço Rosa é voltado a todas as pessoas, de todas as regiões do Brasil, que já sofreram com a queda de cabelos devido a alguma doença.
“A peruca é só um detalhe. O que a pessoa recebe é esse apoio, esse acolhimento, esse colo. É saber que alguém em algum lugar se importa com aquilo que ela está passando e sabe que aquilo não tem nada a ver com beleza, que tem a ver com a identidade, com esse momento tão delicado do tratamento do câncer”, diz.
Para solicitar a peruca, basta acessar a loja online da Fundação Laço Rosa, escolher o modelo, preencher o formulário e aguardar o recebimento em casa, sem custos. Já para quem deseja doar a mecha de cabelos para fabricação das perucas, basta ler as instruções no site.
Para garantir a segurança e diminuir os riscos de contágio, as doações das perucas e o recebimento das mechas foram temporariamente suspensos. A previsão é que a retomada das atividades seja feita quando a pandemia chegar ao fim.