A importância do advocacy para o fortalecimento de causas sociais
2º dia da Conferência Nacional de Advocacy contou com debates sobre legislação e parcerias
por Artur Ferreira
Esta semana, ocorreu a 1ª Conferência Nacional de Advocacy, na FMU – Campus Liberdade, em São Paulo. Em seu segundo dia, o evento contou com discussões sobre a preparação de um plano consistente de advocacy, sobre como funciona o processo e como construir parcerias estratégicas para fortalecer uma causa.
Advocacy é toda campanha feita por um indivíduo, organização ou grupo de pressão para influenciar na tomada de decisões do poder público, atuando principalmente na formulação de políticas públicas e alocação de recursos.
Processo Legislativo
As palestrantes Elisa Araújo (Pulso Público) e Silvia Souza (Conectas) contaram sua experiência no processo de advocacy relacionado à votação da Medida Provisória (MPV) 870/2019.
Uma Medida Provisória é uma norma com força de lei editada pelo Presidente da República em situações de relevância e urgência. A validade de uma MPV é de 60 dias, e caso ela não tenha sido votada nas duas Casas do Congresso Nacional (Câmara e Senado) seu prazo é prorrogado por mais 60 dias.
A MPV 870 se tratava da medida decretada pelo presidente Jair Bolsonaro no primeiro dia de seu mandato (1 de janeiro de 2019), que estabelecia a nova organização básica dos órgãos da Presidência e dos Ministérios.
A medida foi questionada por várias organizações da sociedade civil (OSCs) por falar em seu texto em controle de OSCs por parte da Secretaria do Governo, alteração das competências da Fundação Nacional do Índio (FUNAI), extinção do Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e transferência do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) para o Ministério da Justiça.
Elisa, que atuou principalmente na pauta da FUNAI, explica que, para influenciar as decisões tomadas na implementação de uma política pública definida em uma MPV, a sociedade civil precisa agir na primeira fase de votação da medida, a Comissão Mista.
A votação de uma MPV após o decreto presidencial é dividida em três partes: Comissão Mista (formada por um presidente de comissão, relator, e deputados e senadores escolhidos para representar suas pautas e partidos na votação), Plenário da Câmara de Deputados e o Plenário do Senado Federal.
A Comissão Mista é importante para o advocacy devido à menor quantidade de parlamentares presentes, escolhidos a dedo por seus partidos e bancadas. Elisa afirma que “mapear os atores atuantes naquela situação” é fundamental para progredir com a sua pauta.
Para defender a antiga organização da FUNAI, Elisa conta que estudou os perfis dos deputados contra ou a favor da MPV presentes, pois, de acordo com a consultora, não se deve perder tempo e trabalho tentando convencer os parlamentares que não contribuirão com a sua pauta.
Entender o histórico e vivência de cada parlamentar, os partidos de onde vieram e as opiniões do presidente e do relator é a base para que sua campanha de advocacy alcance o objetivo desejado.
Silvia reitera essa conclusão e conta que advogou pela não criação de um mecanismo de controle do governo para as OSCs. Segundo ela, um dos desafios envolvendo a MPV 870 foi o período do ano. Como a MPV foi decretada em 1º de janeiro, muitos representantes de organizações, ativistas e políticos estavam de férias, então houve menos tempo para fazer o advocacy antes da votação.
De acordo com as palestrantes, foi um momento de trabalho intenso, formulando emendas para o texto, produzindo pesquisas e fichas técnicas e criando campanhas para engajar a sociedade civil. Além disso, era necessário manter contato com parlamentares e seus assessores diariamente.
Por fim, ambas comemoraram a conquista, já que conseguiram barrar o texto original da MPV 870. Ao todo, foram escritas mais de 500 emendas para a medida, requisitando alterações no texto original.
Plano de Advocacy
Além de entender as questões legais sobre o tema, para que sua campanha de advocacy tenha efeito, é fundamental ter um bom planejamento estratégico.
A palestrante Daniela Castro, da Impacta Advocacy, frisou alguns dos principais pontos para se montar um plano de advocacy. Daniela primeiro define que existem duas formas de atuação de uma organização: o advocacy e o atendimento direto.
Ela reitera que dentro de uma organização pode haver as duas formas de ação, mas explica que o advocacy precisa entender e ser combativo na raiz do problema, enquanto o atendimento direto se foca nos sintomas daquela questão.
Daniela, que já trabalhou com a Fundação Abrinq, afirma que as formas de advocacy são várias e que a organização precisa pensar no método que melhor serve ao seu propósito, como pesquisa, lobby e criação de campanhas.
Um bom plano auxilia em variadas questões, pois, além de economizar tempo e recursos, traz credibilidade para a instituição e um foco claro.
É necessário também que o plano seja flexível, já que precisa ser constantemente revisto e aprimorado. Além disso, Daniela recomenda que sejam estabelecidas metas mensuráveis.
A palestra seguiu com a fala de Leandro Machado, da Cause. “Advocacy é um processo organizado para influenciar tomadas de decisões”, reforçou. Sua fala teve como foco o engajamento para uma campanha.
“Engajamento é a intensidade de um indivíduo querer se conectar ou participar de uma marca ou organização”, explicou. Ele também completa dizendo que, no contexto do advocacy, engajamento é um recurso finito que não se mede por dados numéricos, e sim como uma onda (com momentos de baixa e alta).
Daniel explica que a campanha deve ser algo imediato, tangível para seu espectador, e que ofereça ao público alguma forma de retorno, uma forma de reciprocidade.
O palestrante deixa claro que engajamento por uma causa é, muitas vezes, no primeiro momento um fator emocional, que será racionalizado no futuro, portanto a campanha de advocacy precisa ser algo benéfico à causa escolhida e ao público que acompanha esse trabalho. Isso significa que é fundamental conhecer o seu público para conquistar engajamento com a causa.
Parcerias Estratégicas
A Conferência também promoveu uma mesa de debate sobre o tema de criação de parcerias para promover uma pauta de interesse público, gerando assim um trabalho de advocacy.
Mediada por Ana Valéria Araújo (Fundo Brasil de Direitos Humanos), a mesa reuniu Isabella Henriques (Instituto Alana), João Feres (Observatório do Legislativo Brasileiro – OLB) e Moriti Neto (O Joio e o Trigo).
Todos falaram sobre a importância das parcerias para fortalecer uma causa e sobre a dificuldade para concretizar essas parcerias.
Isabella trouxe o estudo de caso do Instituto Alana, que investiu na produção de documentários e filmes sobre as causas defendidas pelo Instituto. Em produções realizadas em parceria com a Maria Farinha Filmes, a organização produziu filmes sobre publicidade e obesidade infantil e sobre as questões da mineração e do desmatamento na Amazônia.
Obras como ‘Criança, A Alma do Negócio’ (2008), sobre publicidade infantil, foram pautadas pela mídia ao longo de alguns anos, e o tema se fortaleceu tanto que chegou à redação do Enem em 2014.
Atualmente, Isabella comemora que, após uma série de documentários, o instituto produziu sua primeira série de ficção, ‘Aruanas’, que mostra o drama de mulheres que atuam em uma OSC na Amazônia e precisam lidar com a mineração e o desmatamento ilegal.
Moriti Neto, outro participante da mesa, é jornalista e entrou em contato com a Aliança de Controle do Tabagismo (ACT) devido a uma pauta sobre a produção ilegal de tabaco no sul do Brasil, para a qual não tinha recursos suficientes.
A ACT então lhe ofereceu um financiamento para a pauta, que ganhou prêmios e virou um livro sobre o tabaco ilegal no país. Posteriormente, a ACT decidiu criar um projeto editorial focado na indústria alimentícia e Moriti foi convidado para ser um dos responsáveis pelo projeto, batizado de ‘O Joio e o Trigo’.
O jornalista afirma que organizações e jornalistas podem atuar juntos quando há um tema em comum que se deseja abordar e investigar. Atualmente, a agência de notícias produz pautas para sites como UOL e Intercept Brasil.
João Feres, do Observatório do Legislativo Brasileiro, falou de como é fazer parte de uma organização de pesquisa e monitoramento do poder público, e como é construir essas pesquisas para angariar parceiros.
O OLB conta com parceiros como o Instituto Alana, a ACT, a Associação Brasileira de Ciência Política (ABCP) e o Intervozes.
Segundo João, produzir pesquisas sobre o ativismo dentro do poder público foi essencial para atrair a atenção de outras organizações.
João explica que o OLB realiza diversas atividades para monitorar parlamentares, como análises de votações, rankings de ativismo (nível e engajamento dos deputados com as causas) e boletins sobre as atividades desses congressistas.
Para ele, é fundamental esse trabalho de pesquisa para construir uma base de dados sólida, capaz de sustentar diversas campanhas de advocacy.
João também deixa claro que além de tornar seu trabalho interessante a outras organizações, é necessária uma boa assessoria de imprensa para que o jornalismo também se sinta atraído pelo seu trabalho de pesquisa e que paute a mídia.
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26/09/2019 @ 11:24
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