Executivo troca mercado financeiro por projeto social
Alex de Melo criou a ONG Meu Sonho Não Tem Fim para divulgar exemplos de cidadania
Por: Isabela Alves
Alex Cardoso de Melo, 46 anos, veio de uma família humilde do Tatuapé, bairro da zona leste de São Paulo. Mas foi só quando tinha 15 anos que tomou consciência do quanto a sociedade brasileira é desigual.
Isso aconteceu ao ver uma mulher idosa sentada em um caixote, na esquina da Rua Direita com a Rua Quintino Bocaiúva, no centro de São Paulo. A senhora segurava uma tigelinha de alumínio e estava pedindo esmola. Aquela cena tocou Alex de forma inesperada.
Mais do que o incômodo de ver a senhora naquela situação de pobreza escancarada, Alex sentiu o peso da indiferença das pessoas que passavam na rua. Então, ele decidiu que, a partir dali, faria algo para mudar o mundo de maneira positiva.
Alex, que já trabalhava no Banco Nacional na época, começou a poupar 30% do seu salário. E seguiu fazendo isso pelos 12 anos seguintes, até ter condições de fundar sua própria ONG.
E, enquanto não conseguia criar uma organização sem fins lucrativos, resolveu atuar como voluntário de duas entidades.
A primeira foi o Lar da Infância de Nice, localizado na Vila Carrão, que cuida de crianças que foram retiradas de suas casas por conta de violência doméstica. A segunda foi o Abrigo da Velhice Desamparada Bezerra de Menezes, na Penha, que cuida de idosos abandonados pela família. A emotividade dele, no entanto, fez com que abandonasse ambas as instituições em menos de dois meses.
“Tentei ser voluntário e até brinco que fui o pior voluntário do mundo. Na casa de crianças, por exemplo, eu ficava em um canto tentando absorver aquilo e as crianças diziam ‘eu estou feliz, vem brincar comigo’, e eu falava para a minha namorada na época, que hoje é a minha esposa: ‘que voluntário é esse que vem aqui consolar e é consolado? ’. Eu não consegui ficar por muito tempo”, explica.
Na época em que trabalhava no banco, ele criou um folheto chamado ‘Hoje é sexta-feira’, no qual colocava piadas e uma frase motivacional. Logo todos os funcionários queriam receber o folheto e Alex viu como poderia ajudar a transformar vidas: motivando as pessoas a fazerem o bem.
Aos 30 anos, Alex era o superintendente mais novo do banco em que trabalhava, mas largou sua carreira no mercado financeiro para criar a ONG com a qual sonhava e se dedicar em tempo integral a ela. Não demorou muito, porém, para que ele percebesse que precisava encontrar um novo emprego para sustentar seu projeto social e a família. Foi nesse momento que criou a empresa Luminia e determinou que 50% do lucro líquido iria para a sua organização sem fins lucrativos. “A gente vê muita empresa que cria ONG. De certa forma, essa aqui é uma ONG que criou uma empresa”.
A Meu Sonho Não tem Fim
A Meu Sonho Não tem Fim foi fundada em 12 de agosto de 1997, com o objetivo de divulgar histórias de grandes personalidades que mudaram o mundo e relacioná-las a virtudes, como a bondade de Mahatma Gandhi, a fé de Madre Teresa de Calcutá e o otimismo de Charlie Chaplin.
O nome da instituição foi inspirado no famoso discurso de Martin Luther King ‘I Have a Dream’, feito em 28 de agosto de 1963, e o líder ativista foi seu primeiro grande sonhador. “A história dele me impactou muito. Ver a situação dos negros naquela época da segregação no sul dos Estados Unidos e como Martin Luther King sabia que só iria vencer através do amor”, afirma Alex.
No início, o empresário enfrentou diversas dificuldades. A maior delas foi o julgamento das pessoas por ele ter abandonado um bom emprego para se dedicar a uma ONG, sem receber absolutamente nada por isso, em termos financeiros. “Eu acredito que o ser humano pode evoluir. Mas muitas pessoas não acreditam que um trabalho como esse pode ser independente como é”, conta.
A ONG não aceita doação de nenhuma espécie, não tem política de patrocínio, não comercializa nada, é laica e apolítica. Mas Alex acredita que ela é capaz de alcançar cada vez mais pessoas com suas mensagens. “Os grandes sonhadores não são heróis, mas todos os 24 deram o primeiro passo. Não adianta ficar inconformado, achar que tudo está errado e não fazer nada”. Ele está tentando fazer o seu melhor e acredita que isso é o bastante.
No início de cada ano, a ONG abre inscrições para entidades interessadas em receber gratuitamente suas palestras motivacionais. Por ano, são entre 60 e 80 vagas e um dos lugares mais marcantes em que Alex se lembra de já ter divulgado o seu trabalho foi a Fundação Casa. “Aqueles jovens precisam de exemplos de vida, precisam saber que existe outro mundo além da aflição, esquecimento e violência que eles conheceram a vida toda. Eles têm aquela capa de proteção, porque estão calejados de tudo o que viveram, mas saber que o meu trabalho mexeu com eles faz tudo valer a pena”.
Agora em 2017, a ONG completa 20 anos e tem um novo sonho: publicar os livros ‘Meu Sonho Não Tem Fim’ e ‘Pequeninos Sonhadores’ em braile. O projeto pretende que crianças e adultos com deficiência visual possam tocar e sentir como era a fisionomia de cada um dos sonhadores.
Enquanto esse projeto não sai do papel, Alex de Melo quer continuar a atingir pessoas com suas palestras, pois “não existe público que não seja pertinente para ouvir a palestra. O que importa é disseminar os exemplos de amor ao próximo e tolerância”, conclui.