Desalojados por furacões, menores sofrem com abuso sexual em abrigos
Crianças e adolescentes da América Central foram impactadas pelos furacões Iota e Eta no final de 2020. Nos abrigos, milhares vivenciam uma rotina de violência sexual
Por: Mariana Lima
Estranhos abrem suas barracas, observam enquanto elas tomas banho e tiram fotos sem consentimento. São cenas que se repetem em abrigos dos três países mais atingidos pelos furacões Iota e Eta entre outubro e novembro de 2020: Guatemala, Honduras e Nicarágua, localizados na América Central.
A estimativa é de que os furacões tenham deixado mais de 350 mil pessoas vivendo em abrigos. Deste total, pelo menos 50 mil seriam crianças e adolescentes. Além disso, ao menos 40 pessoas morreram.
Governos e organizações da sociedade civil revelam que são as meninas e adolescentes as mais vulneráveis entre os desalojados, uma vez que, além de estarem sob condições precárias, acabam sendo submetidas à violência sexual.
Algumas meninas precisaram ser transferidas para outros abrigos para serem protegidas. Em Honduras, denúncias de abusos já provocaram operações policiais.
Angie, uma adolescente de 13 anos chamada assim para proteger sua identidade, mora em Puerto Cabezas, no noroeste da Nicarágua, e está vivendo em um abrigo após os furacões de novembro.
A casa dela foi destruída e, hoje, a falta de água potável é um dos muitos problemas com os quais precisa conviver.
Em um relatório da ONG Plan International, ela contou um pouco do que tem enfrentado. “Nós, mulheres, quando estamos menstruadas, é difícil não podermos nos limpar, pois crianças e adultos estão sempre ali espionando, e não tem absorvente. Temos que nos lavar e não temos água”.
No documento, Angie contou mais detalhes dos riscos que passa no abrigo em que está vivendo. “Os adultos me dizem coisas que me deixam desconfortável. Eles me incomodam, não me deixam me limpar ou tomar banho direito, porque estão sempre lá me espionando. Eu me sinto vigiada”.
A violência sexual contra menores desalojados não é uma ocorrência restrita à Nicarágua. Honduras, por exemplo, vem fazendo um esforço para monitorar os abusos e já interveio em mais de 100 abrigos desde novembro.
De acordo com a direção da pasta de criança e família (DINAF) do governo de Honduras, há mais de 6.400 menores sob proteção direcionada para evitar que sofram agressões sexuais.
Na Guatemala, houve até o relato de uma menina de 9 colocada “à venda”, de acordo com Otto Rivera, diretor do Observatório dos Direitos da Criança do país.
A menina achava que seus pais haviam morrido após a passagem do furacão Eta, e um adulto tentou “vendê-la”. O caso de tráfico humano ocorreu no departamento de Alta Verapaz, no norte do país. O pai da menina estava vivo e conseguiu resgatá-la três dias depois.
O Observatório dos Direitos da Criança afirma que sete em cada dez menores vítimas de tráfico ou desaparecimento são meninas e adolescentes.
Com base nos depoimentos coletados pela Plan International, as meninas informam a inexistência de privacidade e de proteção à intimidade. Os banheiros são compartilhados com todos no abrigo e possuem pouca vigilância.
Fonte: BBC News Brasil