Ela lutou até a morte pelo filho que foi torturado e morto pela ditadura
Zuzu Angel (1921-1976) foi uma das maiores estilistas brasileiras, além de mãe do militante político Stuart Angel Jones, da jornalista Hildegard Angel e de Ana Cristina Angel.
Pioneira na moda brasileira, fez sucesso com seu estilo em todo o mundo, principalmente nos Estados Unidos. Nos desfiles, sempre abordou a alegria e riqueza de cores da cultura brasileira, fazendo sucesso no universo da moda daquela época. Foi ela também quem trouxe para o Brasil e popularizou no universo da moda nacional o termo “fashion designer”.
Nos anos 1940, Zuzu conheceu o norte-americano Norman Angel Jones, em Belo Horizonte, e se casou com ele em 1947. Após alguns anos juntos, foram para o Rio de Janeiro, mudando-se depois para Salvador, onde ela morou muitos anos.
No Rio de Janeiro, Zuzu deu à luz seu filho Stuart Edgar. Na virada dos anos 60 para os anos 70, Stuart Jones, filho de Zuzu e então estudante de economia, passou a integrar as organizações de esquerda que combatiam a ditadura militar no Brasil, instaurada em 1964.
Preso em 14 de abril de 1971, Stuart foi torturado e morto pelo Centro de Informações da Aeronáutica (CISA), no aeroporto do Galeão, e dado como desaparecido pelas autoridades.
Depois disso, Zuzu Angel começou a confrontar de forma direta o regime militar, para recuperar o corpo do filho.
Como estilista, ela criou uma coleção estampada com manchas vermelhas, pássaros engaiolados e motivos bélicos. O anjo, ferido e amordaçado em suas estampas, tornou-se também o símbolo do filho.
Em setembro de 1971, realizou um desfile-protesto no consulado do Brasil em Nova York, tecnicamente território brasileiro, pois uma lei da ditadura militar impedia que brasileiros criticassem o país no exterior.
Em 15 de setembro daquele ano, sua luta chegava aos jornais internacionais, com a manchete no canadense The Montreal Star: “Designer de moda pede pelo filho desaparecido”. Cinco dias depois, era a vez do Chicago Tribune trazer a manchete “A mensagem política de Zuzu está nas suas roupas”.
Com sua relativa notoriedade internacional, ela envolveu em sua causa celebridades de Hollywood que eram suas clientes, como Liza Minelli.
Apelou a diversos políticos importantes e celebridades para que ajudassem a encontrar o corpo de seu filho. Em maio de 1973, foi ao apartamento do general Ernesto Geisel no Leblon.
Durante a visita de Henry Kissinger, então secretário de Estado norte-americano, ao Brasil, em 1976, Zuzu chegou a furar a segurança para entregar-lhe um dossiê com os fatos sobre a morte do filho.
A busca de Zuzu pelas explicações, pelos culpados e pelo corpo do filho só terminou com sua morte, ocorrida na madrugada de 14 de abril de 1976, num acidente de carro na Estrada da Gávea, à saída do Túnel Dois Irmãos, no Rio de Janeiro, hoje batizado com seu nome.
Uma semana antes do acidente, Zuzu deixou na casa de Chico Buarque de Hollanda um documento que deveria ser publicado caso algo lhe acontecesse, em que escreveu:. “Se eu aparecer morta, por acidente ou outro meio, terá sido obra dos assassinos do meu amado filho”.
Em 1998, a Comissão Especial dos Desaparecidos Políticos julgou o caso sob número de processo 237/96 e reconheceu-a como pessoa que, “por ter participado, ou por ter sido acusada de participação, em atividades políticas, tenha falecido por causas não-naturais, em dependências policiais ou assemelhadas”.
Em seu relatório final, publicado em 2007, a Comissão inseriu depoimentos de duas testemunhas oculares do acidente, sendo um deles prestado indiretamente, que afirmaram ter visto o carro de Zuzu ter sido fechado por outro e jogado fora da pista, caindo de uma altura de cerca de cinco metros.
Depois de sua morte, Zuzu foi homenageada em livros, música e filme. Chico Buarque compôs, sobre melodia de Miltinho, a música ‘Angélica’, em 1977, em homenagem à estilista. Em 1988, o escritor José Louzeiro escreveu o romance ‘Em carne viva’, com personagens e situações que lembram o drama de Zuzu Angel.
Em 1993, foi fundado o Instituto Zuzu Angel de Moda do Rio de Janeiro, a primeira ONG de moda do país, que visa difundir a moda brasileira, seus profissionais e a memória dos Angel.
Em 2006, o cineasta Sérgio Rezende dirigiu ‘Zuzu Angel’, filme que retrata a vida da estilista. O filme é protagonizado por Patrícia Pillar e tem Daniel de Oliveira interpretando Stuart Edgar.