Em 2022 o Brasil registrou, em média, 203 desaparecimentos de pessoas por dia
Segundo dados, em 2022 o Brasil registrou 74.061 pessoas desaparecidas, média de 203 desaparecimentos diários.
Segundo dados da 17ª Edição do Anuário de Segurança Pública, em 2022 o Brasil registrou 74.061 pessoas desaparecidas, média de 203 desaparecimentos diários. Do total de registros, 46,7% se concentram na região Sudeste, em muito puxados pelo estado de São Paulo, que registrou 20.411 ocorrências. Em seguida a região Sul, com 22,3% do total, cujo destaque é o Rio Grande do Sul, em que os registros alcançaram a marca de 6.888 ocorrências.
A região Nordeste, por sua vez, concentrou 14,8% do total, seguida pelas regiões Centro-Oeste e Norte, que concentraram 9,7% e 6,5%, respectivamente. A despeito de São Paulo concentrar quase 30% dos números absolutos dos registros de desaparecidos, é o Distrito Federal que se destaca quando analisamos a taxa por 100 mil habitantes. Com 83,3 por 100 mil, é a maior taxa do país e mais do que o dobro da nacional, que fica em 32 por 100 mil, como sinaliza o gráfico abaixo.
Isso não significa, entretanto, que somem mais pessoas no DF do que no resto do país. Na primeira edição do Mapa dos Desaparecidos analisamos, brevemente, os casos no Distrito Federal a partir de uma informação constatada na análise dos registros de ocorrência: a Polícia Civil do DF é a única que vincula o registro de desaparecimento ao registro de localização no próprio Boletim de Ocorrência.
Em outras palavras, quando uma pessoa é localizada, seu registro de desaparecimento é retirado da base e adentra, apenas, nas estatísticas de localização. Dessa forma, a polícia sabe exatamente quem continua desaparecido (FBSP, 2023 ).
O que chama atenção ao compararmos as taxas é que em apenas dois estados, Goiás e Minas Gerais, os registros de desaparecimento diminuíram entre 2021 e 2022, com retração de 8,8% e 1,2%, respectivamente. No restante do país, todos os estados viram seus registros aumentarem, com destaque ao Amapá, cujo crescimento foi de 78,4%. No Acre, Roraima e Bahia o crescimento também foi expressivo, com aumento de mais de 50%. A nível nacional, os registros de desaparecimento cresceram em 12,9% quando comparados ao ano anterior.
Ao mesmo tempo, o número absoluto dos registros de localização também cresceu. Se em 2021 eles totalizaram 33.794, em 2022 eles atingiram 39.957, aumento de 18,2%. Não é possível dizer, entretanto, se as pessoas localizadas em 2022 desapareceram no referido ano ou em períodos anteriores. Não é possível dizer, também, se os registros de localização foram abatidos das ocorrências dos desaparecimentos, com exceção do Distrito Federal, mencionado anteriormente.
Analisando a série histórica é possível observar a queda acentuada dos registros no ano de 2020 em comparação ao período anterior, considerando que este foi o ano marcado pelo início da pandemia de Covid-19. Com o isolamento social, o número de idas à delegacia para registrar o desaparecimento pode ter diminuído, embora em vários estados seja possível registrá-lo, como é o caso de São Paulo, via boletim eletrônico.
A questão do desaparecimento começou a ser discutida na América Latina antes de virar pauta na política internacional. As Mães da Praça de Maio, na Argentina do final dos anos 1970, chamavam a atenção aos desaparecidos políticos que, assim como em muitos países do continente latino-americano, sofreu com a prática enquanto tática de repressão nos períodos da ditadura. O assunto ganha destaque internacional 20 anos depois, com a Declaração sobre a Proteção de Todas as Pessoas contra os Desaparecimentos Forçados da ONU, em 1992. Dois anos depois, em 1994, a Organização dos Estados Americanos firma a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, mas a sociedade civil, em especial os familiares de vítimas da violência, já se mobilizava em torno da temática (Leal, 20193).
No Brasil, as movimentações giram primeiro em torno do desaparecimento de crianças: em 1992 surge o Movimento Nacional em Defesa da Criança Desaparecida (Cridespar), que auxiliou na criação do Serviço de Investigação de Crianças Desaparecidas (Sicride), no Paraná (Leal, 2019). Em 2004, a lei estadual 14.493/14 determina o registro e busca imediata de crianças pelas autoridades policiais, sem que se aguarde 24 ou 48 horas para o início da busca, legislação que, no ano seguinte, se torna lei federal – 11.259/2005, além de alterar o artigo 208 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que criminaliza o policial e/ou a delegacia que não registrar e não iniciar a busca imediata de crianças e adolescentes desaparecidos (Idem.). Entretanto, pouco se discute, na legislação, sobre os outros tipos de desaparecimento, inclusive o forçado, embora a Corte Interamericana de Direitos Humanos tenha responsabilizado o Brasil, em 2010, a tipificar o desaparecimento forçado enquanto crime (Araújo, 20165). O que se tem, até o momento, é o Projeto de Lei 6.240/2013, que tipifica o crime de desaparecimento forçado e o torna hediondo.
O Projeto aguarda apreciação do Plenário. Pouco se discute, na verdade, sobre o desaparecimento em geral. Como mostramos na primeira edição do Mapa dos Desaparecidos no Brasil, até 2019 o conceito de desaparecido não existia na legislação brasileira (FBSP, 2023). Ele só foi definido com a Lei 13.812/19, a Política Nacional de Busca de Pessoas Desaparecidas, em que o desaparecido é “todo ser humano cujo paradeiro é desconhecido, não importando a causa de seu desaparecimento, até que sua recuperação e identificação tenham sido confirmadas por vias físicas ou científicas.
Criada em 1996, a ONG Mães da Sé busca pessoas desaparecidas e também informa as mães sobre os seus direitos e medidas que elas podem tomar para encontrar o ente querido de maneira mais rápida.
Ivanise da Silva Santos criou a ONG após sua filha Fabiana, que tinha 13 anos na época, ter desaparecido no dia 23 de dezembro de 1995. Quando o fato ocorreu, não existiam câmeras nas ruas e a polícia tratou Ivanise de maneira desrespeitosa no momento em que ela foi abrir um boletim de ocorrência.
A busca pela sua filha permanece até os dias de hoje. Por conta de sua história, ela se uniu a outras mães que passam pela mesma situação para ajudá-las e dar todo o suporte jurídico necessário, já que nove pessoas desaparecem por hora no Brasil. Para conhecer melhor o trabalho da ONG Mães da Sé clique aqui.
Fonte: 17ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública