Parâmetros sociais e ambientais para obras são negligenciados no Brasil
Normas da ONU para a proteção dos direitos humanos e do meio ambiente quase sempre são desrespeitadas
Grandes obras demandam uma série de estudos técnicos na área de infraestrutura, para então serem iniciadas. Isso é respeitado pelas empresas sem grandes aborrecimentos, já que se trata da estrutura física do empreendimento. Mas também é preciso ter o mesmo cuidado com as questões que envolvem os impactos sociais e ambientais que essas construções podem gerar.
Em 2011, a Organização das Nações Unidas (ONU) publicou um compilado de orientações que devem ser seguidas pelas empresas e países quando estes pretenderem implantar uma grande obra pública. Com o intuito de evitar possíveis violações aos direitos humanos e diminuir as alterações sofridas pela população local e o meio ambiente.
Segundo o documento, “Princípios Orientadores de Empresas e Direitos Humanos”, as construtoras e financiadores de uma obra devem elaborar um plano diretor que prevê a identificação de possíveis violações. A partir disso, as empresas devem adotar medidas para impedir as infrações identificadas, monitorar os riscos e avaliar a eficiência das ações. Além disso, todos os passos devem ser comunicados a sociedade.
Julia Cortez, assessora de Desenvolvimento de Direitos Socioambientais da Conectas, defende que se colocados em prática os princípios orientadores atendem aos interesses econômicos e sociais: “Eles querem conciliar atividades econômicas com a proteção dos direitos humanos, até porque em muitos casos essas atividades podem maximizar isso, dando o direito ao trabalho, o direito a ter uma renda compatível com a necessidade da população, por exemplo”.
Porém, no Brasil essas determinações não são seguidas. A assessora revela que o Grupo de Trabalho da ONU sobre Empresas e Direitos Humanos fez uma série de recomendações ao Estado brasileiro de como trabalhar os princípios orientadores, mas de acordo com levantamento da Conectas somente 7,2% dessas medidas foram implantadas de forma satisfatória ou significativa.
Uma das orientações é a promoção de audiências públicas, que têm o papel de ouvir o posicionamento da população local, que tende a sofrer os maiores impactos dessas construções. No Brasil, no que diz respeito à concessão ambiental, esses encontros são sustentados pela legislação.
No caso da construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, inaugurada em 2015, as audiências públicas foram realizadas. Houve um embate entre o governo, ambientalistas e os moradores indígenas sobre a implantação do empreendimento. Os habitantes demonstraram contrariedade ao projeto, mas apesar da negativa civil a hidroelétrica foi construída e resultou em vários descumprimentos aos direitos humanos da população local e do entorno.
Julia Cortez destaca a responsabilidade do Brasil nessa violação: “O Estado não só iniciou o projeto (Belo Monte) como foi o agente que licenciou e financiou a obra (BNDS), e fez pressão política significativa para que ocorresse, apesar de oposição. Ele poderia atuar por dentro pra garantir que as políticas fossem melhores e não fez isso”.
Ela também alerta para o papel fiscalizador da sociedade, que deve denunciar quando essas empreitadas infligem os direitos sociais e civis. Ainda de acordo com a Organização das Nações Unidas, tanto o Estado quanto as empresas têm o dever de garantir que o meio ambiente e as comunidades vão ser reparados em caso de violações.
Colaboração da estudante de jornalismo Carolina Franca, que participa do Projeto Repórter do Futuro: Jornalismo e Direitos Humanos.