Protestos contra violações de direitos humanos marcam Copa do Mundo de 2022
As seleções de países como Alemanha, Dinamarca e Inglaterra têm feito protestos contra a decisão da FIFA de sediar a Copa do Mundo no Catar, país com leis que violam diversos direitos humanos
Por Ana Clara Godoi
A Copa do Mundo da FIFA de 2022 teve início no dia 18 de novembro e já registrou diversos protestos dentro e fora de campo. As críticas são direcionadas à FIFA (Federação Internacional de Futebol) pela decisão de sediar esta edição da competição no Catar, país do Oriente Médio que viola diversos direitos humanos relacionados à mulheres, jornalistas, imigrantes e membros da comunidade LGBT.
No Catar, relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo são consideradas crime e têm pena de até sete anos de prisão. De acordo com a organização de direitos humanos Human Rights Watch, o governo censura conteúdos relacionados a orientação sexual e identidade de gênero, e há relatos de membros da comunidade LGBT sendo presos por atividades online. Embora o governo do Catar tenha afirmado durante as preparações para a Copa que aceita turistas da comunidade LGBT e que não irá restringir sua expressão, um embaixador do evento no país disse em uma entrevista que a homossexualidade era um “dano na mente”.
A violação de direitos das mulheres também é uma situação constante no Catar. As mulheres catarinas vivem sob o sistema de tutela masculina e precisam pedir autorização de seus tutores (pai, irmão ou marido) para casar, viajar, trabalhar para o governo, estudar no exterior e realizar tratamentos de saúde reprodutiva ou exames ginecológicos. A lei do Catar também diz que as mulheres casadas não podem se recusar a fazer sexo. Além disso, os casos de estupro quase não são denunciados no país, pois na maioria das vezes a legislação local enxerga a situação como adultério, que é considerado crime, e pune as mulheres.
Organizações como a Anistia Internacional e Human Rights Watch também têm denunciado casos de maus tratos relacionados aos trabalhadores estrangeiros no Catar, como jornadas de trabalho de mais de 14 horas por dia. No dia 29 de novembro, o chefe da organização da Copa do Mundo no Catar, Hassan Al-Thawadi, afirmou que “entre 400 e 500” pessoas morreram durante a preparação do país para receber a competição. A causa das mortes ainda não foi divulgada. No entanto, sabe-se que os trabalhadores morreram durante a construção de estradas, hotéis, pontes, estádios e obras de saneamento.
Protestos dentro e fora do campo
Três dias após o início da Copa do Mundo, a Alemanha realizou um protesto ao posar para uma foto antes do jogo com o Japão. Os jogadores alemães taparam suas bocas como forma de crítica à proibição da FIFA de usar a braçadeira de capitão da campanha “One Love” durante os jogos. O item é uma homenagem e demonstração de apoio à comunidade LGBT.
Outro país a protestar contra as decisões da FIFA foi a Inglaterra. Na estreia contra o Irã, os jogadores cantaram o hino e se ajoelharam em campo, em forma de protesto antirracista. A Dinamarca, por sua vez, retirou o brasão da camisa da seleção e o presidente do time cogitou se desfiliar da FIFA. Já a Holanda decidiu leiloar os uniformes utilizados nos jogos e doar o dinheiro arrecadado para trabalhadores estrangeiros no Catar.
O Irã também registrou protestos ao longo da partida. Além de os jogadores se recursarem a cantar o hino nacional em forma de crítica ao regime teocrático do Irã, os torcedores apresentaram cartazes com a palavra Azadi, que significa liberdade em persa.
Durante a partida de Portugal e Uruguai, na segunda semana de competição, um torcedor invadiu o campo para protestar em solidariedade a comunidade LGBT, as mulheres do irã e a população da Ucrânia. O homem segurava uma bandeira do orgulho LGBT e vestia uma camiseta com as mensagens “salve a Ucrânia” e “respeitem as mulheres iranianas”. A transmissão da FIFA não mostrou a ação do torcedor.
Para o professor do Instituto de Relações Internacionais e membro da Comissão de Direitos Humanos da Universidade de São Paulo, Pedro Dallari, protestos em favor dos direitos humanos sempre são relevantes e produzem efeito, mesmo que não imediatamente.
“A afirmação dos direitos humanos resulta de um processo de mobilização permante e universal, que vai penetrando inclusive as estruturas sociais e políticas mais herméticas. As atuais manifestações populares na China e no Irã são um bom exemplo. O apoio da torcida e da equipe iraniana no Qatar ajudaram a repercutir internacionalmente essas manifestações contra o governo de Teerã”.
A discussão em torno da violação dos direitos humanos está alinhada aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 5 – Igualdade de gênero, ODS 8 – Trabalho decente e crescimento econômico, ODS 10 – Redução das desigualdades e ODS 16 – Paz, justiça e instituições eficazes. Os ODS são metas da ONU para 2030, que promovem uma sociedade mais justa, igualitária e sustentável.