Brasil não possui ações de prevenção à violência sexual contra crianças
Conversamos com Lucas José Ramos Lopes, membro da Coalizão Brasileira Pelo Fim da Violência Contra Crianças e Adolescentes, sobre a ausência de ações intersetoriais na prevenção da violência sexual contra as crianças
Por Ana Clara Godoi
O Brasil é o segundo país com mais registros de exploração sexual contra crianças e adolescentes, ficando atrás apenas da Tailândia. Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, foram contabilizados, em média, 130 casos diários em 2021. Quando se trata do Objetivo de Desenvolvimento Sustentável (ODS) 16, que diz respeito ao enfrentamento das violências, o país tem 10 de suas 12 metas em retrocesso.
Prevenir a violência sexual e enfrentá-la é parte do mandato Constitucional, no entanto, o Brasil não possui uma estratégia intersetorial com foco na prevenção. Um novo estudo produzido pela Economist Impact, da The Economist, aponta que o Brasil está entre os países com mais elevada classificação em prevenção e resposta à exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes. Mas quando se analisa a prevenção isoladamente, a posição é a 25ª, considerada baixa.
A Coalizão Brasileira Pelo Fim da Violência Contra Crianças e Adolescentes é uma das iniciativas do terceiro setor que busca induzir no planejamento do governo federal a elaboração de uma estratégia nacional crível e sustentável, baseada em evidências e integrada na legislação orçamentária. Em entrevista para o Observatório do Terceiro Setor, Lucas José Ramos Lopes, membro da Coalização, explica que, embora tenha especificidades, a violência sexual não pode ser prevenida ou enfrentada de isoladamente.
“A violência contra crianças e adolescentes é um fenômeno social complexo, poli vitimizador e endêmico que exige uma arquitetura de políticas públicas e regulatórias financiadas como prioridade e respostas a curto, médio e longo prazo. Sem um investimento continuado em políticas modulares de prevenção e com algum grau de eficiência verificado, as chances de ganhos estruturais na redução do fenômeno são drasticamente reduzidas”.
A responsabilidade de prevenir a ocorrência de violência, ameaças e violações de direitos de crianças e adolescentes é de toda a sociedade, de acordo com o Artigo 227 da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Isso inclui o terceiro setor e a sociedade civil.
“Precisamos de apoio para o desenvolvimento de pesquisas que produzam evidências de qualidade sobre como a violência sexual acontece no Brasil, quem afeta e com quais variáveis. O terceiro setor também pode apoiar financiando e executando em parceria com o poder público políticas e programas baseados em evidências e com foco na prevenção à violência sexual e contribuir com o advocacy no tema em escala nacional”, explica.
Outra ação fundamental é engajar a sociedade em ações que desnaturalizem normas e crenças sociais que reproduzem, invisibilizam e agravam a violência sexual, questionando condutas socialmente aceitas e que são prejudiciais aos direitos de crianças e adolescentes, e propondo novas forma de sociabilidade e comportamentos protetivos.
Criada em 2017, a Coalizão conta com cerce de 50 organizações e instituições que se dedicam ao tema. Uma delas é a Fundação José Luiz Edygio Setúbal, que financia as atividades com foco em advocacy.
O Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, realizado em 18 de maio, tem como objetivo mobilizar a sociedade contra a violação dos direitos sexuais de crianças e adolescentes em todo o país. Para denunciar o crime de violência sexual, disque 190, caso a criança esteja correndo risco imediato; 192 para pedidos de socorro urgente; 100, para registrar uma denúncia anônima; ou entre em contato com o conselho tutelar do município.