Pesquisa traça perfil das fake news sobre vacinas nas redes sociais
Pesquisa encomendada pela Fundação José Luiz Egydio Setúbal e realizada pelo Instituto Democracia em Xeque revela que a disseminação de notícias falsas sobre vacinas mudou de foco – que antes era contra a COVID-19 e agora aponta para o calendário infantil. A Fundação busca combater a desinformação, identificando temas recorrentes, como teorias de conspiração, supostas relações entre vacinas e doenças graves, e promoção de tratamentos alternativos.
Por Redação
O Instituto Democracia em Xeque apresenta o resultado de uma pesquisa que identifica e analisa o conteúdo de notícias falsas sobre vacinas e o comportamento de quem as replica – além de apontar caminhos para que a sociedade combata campanhas de desinformação sobre imunização. O material foi encomendado pela Fundação José Luiz Egydio Setúbal, que atua no advocacy e na disseminação de conhecimento sobre saúde infantil no país.
Entre junho e novembro de 2023, os pesquisadores acessaram mais de 150 mil conteúdos nas plataformas YouTube, TikTok, Instagram, X (antigo Twitter), e nos aplicativos de troca de mensagens WhatsApp e Telegram. Passada a fase aguda da Pandemia – quando a vacina contra o Covid-19 era o principal alvo – e a troca de Governo Federal, percebeu-se mudanças de temática e de tendências, agora com foco nas vacinas mais antigas como as do calendário infantil, e adaptações para driblar as políticas de moderação nas plataformas.
Nas redes em que há moderação mais frequente, como YouTube e Instagram, percebeu-se que o discurso negacionista migrou do conteúdo dos vídeos e postagens para os comentários dos vídeos e postagens. Ou seja: a produção de conteúdo elaborado, que demanda recurso financeiro e tempo, migrou para outras plataformas com menor moderação, diminuiu nas principais plataformas, mas continuam as opiniões pessoais nessas últimas, em níveis até mais irresponsáveis do que os encontrados nas mensagens de WhatsApp e Telegram. Com as alterações na moderação do antigo Twitter, há também um retorno de informações falsas sobre vacinas para a plataforma.
A Fundação está disponibilizando os sete relatórios divididos por plataformas e redes sociais online, com dezenas de gráficos e recortes que servirão para guiar novas ações de enfrentamento. Para acessar os relatórios, clique aqui.
“Quando o Ministério da Saúde lança uma campanha de vacinação infantil na televisão e nas plataformas de redes sociais online, por exemplo, podemos perceber que há uma certa coordenação na reciclagem de informações falsas antigas, buscando assim minar as campanhas positivas”, afirma João Guilherme Bastos dos Santos, diretor de Estudos Temáticos do Instituto Democracia em Xeque.
“Mesmo que os volumes de mensagens sobre o tema diminuam em determinados períodos, como agora, a exposição frequente a esses conteúdos falsos tem potencial para gerar hesitação vacinal, ao passo que essas informações são internalizadas paulatinamente como plausíveis ou possivelmente verdadeiras”, complementa Ana Julia Bernardi, diretora de Projetos do Instituto.
Dentre as linhas de discurso detectadas pelo levantamento, as mais frequentes são:
- Outros países estariam questionando o “experimento” e só o Brasil ainda acreditaria nas vacinas – para justificar essa narrativa utilizam depoimentos traduzidos, artigos de supostas autoridades internacionais, ou atribuídos a universidades renomadas. Alimentadas por grupos conspiracionistas como QAnon e de oposição à Nova Ordem Mundial, as mensagens dão conta de que o Governo estaria em conluio com as grandes farmacêuticas para reduzir sua população;
- Supostas ligações entre vacinação e desenvolvimento de doenças graves. Supostas síndromes e transtornos comportamentais relacionados às crianças são constantemente citados, como o “surgimento” do autismo após a aplicação da tríplice viral. Esse tipo de informação falsa é uma das mais antigas relacionadas às vacinas em geral, não apenas à da Covid-19;
- Mortes de famosos seguem sendo atribuídas à vacinação, bem como a multiplicação de problemas de saúde diversos em pessoas comuns, que supostamente faleceram por se vacinar. Quando a maioria das pessoas no país está vacinada, essa é uma fonte constante para supostos novos casos e falsas correlações entre vacinação e óbitos;
- A sugestão de uso de ivermectina como forma de “desintoxicar” o corpo dos vacinados segue em alta. Assim como sugestão de uso de outros medicamentos como Zeólita, Chá de Funcho, Vitamina C, Vitamina D, carvão ativado e Suramina – inclusive com links de compra destes medicamentos em marketplaces digitais.
Após elencar os discursos, a intenção da Fundação José Luiz Egydio Setúbal e do Instituto Democracia em Xeque é auxiliar a sociedade civil no combater às campanhas de desinformação, estimulando a checagem por diversos órgãos – e não só a que já é feita pela imprensa; auxiliar na construção de campanhas de impacto; articular em parceria aos canais e perfis pró-vacinas; advocacy junto às lideranças de diferentes redes sociais online; fornecer informações relevantes aos meios de comunicação de massa; e promover a educação midiática para o público em geral.
“A fake news de vacina é multiplataforma e identificar seus movimentos é um passo importante para o seu combate. Acredito que o que vem sendo feito é pouco, campanhas de comunicação tradicionais não têm força para combatê-las, e por isso seguimos investigando e articulando para diminuir a hesitação vacinal em nosso país e, assim, dar um futuro melhor às nossas crianças”, conclui José Luiz Setúbal, pediatra e presidente da fundação que leva seu nome.
A iniciativa contribui para os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030 da ONU, especificamente o ODS 3, saúde e bem-estar.
O Instituto Democracia em Xeque foi originado a partir do Projeto Democracia em Xeque, criado em 2021, e que atuou intensamente no ano passado, acompanhando as campanhas e cooperando com o Programa de Enfrentamento à Desinformação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).