O homem que salvou a vida de 114 pessoas que tentaram suicídio em lago
Shiva, que usa apenas um nome, diz que tinha cerca de 10 anos quando se deparou com um grupo de policiais se oferecendo para pagar a qualquer pessoa que trouxesse um corpo de um lago próximo.
Ele ganhou 40 rúpias pelo trabalho, o que hoje vale cerca de R$ 2,90, mas uma quantia razoável para ele na época. Isso foi há 20 anos. Ele agora está com 30 e ainda ajuda a polícia local. Shiva mora ao lado de Hussain Sagar, um grande lago artificial no coração da cidade.
Ponto turístico popular, o lago também é usado durante o festival Ganesha para imergir imagens da divindade hindu.
O lago é conhecido por atrair pessoas que se suicidam, portanto Shiva achou que poderia fazer mais que recolher seus corpos, podia salvar suas vidas. “Já perdi a conta de quantos corpos encontrei. Mas salvei 114 vidas”, disse ele à BBC.
Shiva tem uma história triste. Órfão, ele nunca conheceu seus pais e viveu sua infância em orfanatos e depois nas ruas na cidade de Hyderabad, no sul da Índia. Nas ruas ele conheceu uma mulher e seus filhos. Um dos filhos ensinou Shiva a nadar.
“Perdi muitos amigos ao longo dos anos — devido a vícios, doenças, fome, acidentes”, diz ele. O menino que o ensinou a nadar — “meu irmão Lakshman”, ele o chama — se afogou acidentalmente e outro amigo próximo morreu enquanto tentava salvar outra pessoa. Ele diz que porque não conseguiu salvá-los, está tentando compensar salvando outros.
De vez em quando, as pessoas que ele salva lhe pagam como um símbolo de gratidão. E a cobertura da imprensa local o transformou em uma celebridade secundária, o que rendeu a ele pequenos papéis em filmes. Mas Shiva diz que não considera salvar vidas um emprego.
Shiva agora também está treinando a esposa dele para nadar para que ela possa ajudar a resgatar corpos de mulheres.
O inspetor B Dhanalakshmi, que comanda a delegacia perto do lago Hussain Sagar, reconhece que Shiva tem sido “uma grande ajuda” para eles.
“Não posso confirmar quantas pessoas ele salvou ao longo dos anos, mas acredito que sejam mais de 100”, disse ela à BBC. O suicídio é crime na Índia e muitas pessoas que Shiva salva fogem antes mesmo que ele possa chamar a polícia.
Os motivos das pessoas para o suicídio, diz ele, variam — desde pressões em vestibulares a casos de amor que deram errado até brigas familiares e problemas financeiros. Ele diz que às vezes os idosos tentam se matar quando são abandonados pelos filhos.
Recentemente, ele diz que viu um homem pular no lago, com medo de ter contraído o coronavírus. O amigo do homem então saltou para salvá-lo e Shiva também saltou, mas ele só foi capaz de salvar o amigo. Diz que os familiares do morto nem levaram o corpo, com medo de pegar o vírus.
“Então eu o cremei”, diz ele. “Eu salvei outro homem que disse que sua família começou a negligenciá-lo desde que pensaram que ele tinha o vírus.”
Hussain Sagar está altamente poluído e Shiva, que mergulha na água regularmente sem equipamento ou roupas especiais, diz que desenvolveu erupções cutâneas e pegou outras doenças, incluindo um surto de febre tifóide.
“Não há tempo de passar a marcha. Você tem que reagir rápido. Se você vir alguém pular, você tem que pular imediatamente.”
O lago também cheira mal durante o verão e as cobras são comumente encontradas em suas margens, mas Shiva não tem planos de mudar.
“Quero ficar aqui”, diz ele. “Só se eu ficar aqui, poderei salvar vidas. A satisfação de salvar uma vida é suprema.”
Fonte: BBC News Brasil