Efeitos na sociedade e a política de drogas do governo brasileiro
Por: Paula Moraes
Em 11 de abril de 2019, foi assinado o decreto que põe em efetividade a nova política de drogas brasileira, mas o que ela faz e o que muda são discussões que teremos adiante.
O que é uma política de drogas?
A política de drogas adotada por um país é um conjunto de esforços para a redução da demanda de drogas na sociedade e de sua oferta.
Assim como muitos países, o Brasil fez o primeiro decreto-lei relacionado às drogas baseando-se na convenção internacional do Ópio em Haia no ano de 1912 e suas diretrizes.
Esse decreto-lei foi o de n° 891 de 1938, efetivando ações no âmbito da prevenção, tratamento e repressão às drogas dentro do país.
No ano de 1976, o decreto-lei anterior foi alterado pela lei n° 6.368, que agora adicionava novas medidas em relação à prevenção e repressão ao tráfico, bem como o uso indevido de substâncias que pudessem causar dependência física e psicológica.
Nos anos posteriores, uma série de decretos e leis foram postas para atualizar a lei e institucionalizar órgãos que cuidassem do assunto, como a criação do Conselho Federal de entorpecentes (CONFEN) em 1980, o Fundo de Prevenção, Recuperação e de Combate às Drogas de Abuso (FUNCAB) em 1986 e a Secretaria Federal de Entorpecentes no ano de 1993.
Em 1998, o antigo CONFEN se transformou em CONAD (Conselho Nacional Antidrogas) e criou-se também a Secretaria Nacional Antidrogas (SENAD), respondendo esses órgãos agora à casa militar da presidência da república.
Finalmente, em 2002, um único documento que sintetizava a política de drogas do país foi lançado e aprovado com a lei n° 4.345. E ela expandia as ações de redução de oferta e demanda, denominando-se de Política Nacional Antidrogas (PNAD).
O que é a política nacional de drogas?
Como mencionado anteriormente, em 11 de abril de 2019, a lei n° 9.761 sancionou uma nova política nacional sobre as drogas que revogou totalmente o decreto n° 4.345 de 2002.
O foco agora passa a ser na abstinência do usuário, deixando a antiga política de redução de danos de lado, fortalecendo também as comunidades terapêuticas, que receberam mais incentivo por parte do governo.
Também entram na nova política medidas como:
- Construir uma sociedade protegida tanto de drogas lícitas quanto ilícitas;
- Não admissão de plantio, cultivo, importação e exportação de drogas ilícitas, exceto os autorizados pela União;
- Tratar o usuário, o dependente e o traficante de formas distintas;
- Reconhecimento das comunidades terapêuticas como um espaço de cuidado, acolhimento e tratamento do dependente químico;
- Reconhecimento do vínculo familiar, da espiritualidade, dos esportes, entre outros, como fatores de proteção ao uso, uso indevido e dependência do tabaco, álcool e outras drogas, observando a laicidade do Estado;
- Inclusão, na educação básica, média e superior, de conteúdos relativos à prevenção do uso de drogas lícitas e ilícitas, com ênfase na promoção da vida, da saúde, das habilidades sociais e para a vida, na formação e no fortalecimento de vínculos, promoção dos fatores de proteção às drogas, conscientização e proteção contra os fatores de risco;
- Manter, atualizar e divulgar de forma sistematizada e contínua informações de prevenção sobre o uso de drogas lícitas e ilícitas;
- Garantia de dotações orçamentárias em todos os ministérios responsáveis pelas ações da PNAD e da Política Nacional sobre o Álcool.
Esses são alguns dos pontos ressaltados e que mudaram com a nova política. E essa alteração foi uma mudança drástica em relação ao modelo anterior, e que nos próximos anos já devemos ter um impacto concreto dela.
Números da dependência química hoje no Brasil
A Fundação Oswaldo Cruz em parceria com diversas outras instituições, dentre as quais a Universidade de Princeton e o IBGE, realizou o terceiro levantamento nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira.
Os entrevistados variaram de 12 a 65 anos, e cerca de 4,9 milhões haviam usado alguma substância ilícita nos últimos 12 meses, sendo a maioria homem e sobretudo jovens entre 18 e 24 anos.
A maconha é a droga mais consumida no Brasil: cerca de 7,7% dos brasileiros já a utilizam. A cocaína vem logo em seguida, com 3,1%.
Dessas pessoas, 1,4 milhão delas relataram já ter usado crack ou derivados pelo menos uma vez na vida, correspondendo a 0,9% da população.
Cerca de um terço admitiu já ter usado cigarro industrial pelo menos uma vez, e 13,6% em até um mês antes da pesquisa, correspondendo a 20,8 milhões. E apesar do número alto, o uso do cigarro está em queda.
Sobre o álcool, 46 milhões de pessoas disseram ter feito o uso no último mês anterior à pesquisa, dentre os quais 2,3 milhões apresentaram critérios de dependência, e 4,4 milhões reportaram já terem se envolvido em discussões sob efeito do álcool.
Já segundo um levantamento da Unifesp, 28 milhões de pessoas no Brasil possuem um familiar dependente químico. E foi constatado que dos usuários em tratamento (8 milhões), 73% era poli usuário, ou seja, era dependente de várias drogas, com um tempo médio de 13 anos de uso.
Como auxiliar o dependente a superar o vício?
Compreensão e empatia são o primeiro passo para tal. O ideal é que você seja presente e ativo para com o dependente, pesquise sobre a dependência e a droga a qual ele depende, conhecimento é um forte aliado. Exercite o diálogo com a pessoa sobre os temas que forem possíveis, a doença também pode ser um deles. Contudo há coisas que só especialistas podem fazer, procurar ajuda pode ser o que de melhor você tenha a oferecer.
Acompanhamento psicológico
O acompanhamento psicológico deve ser realizado por um psicólogo ou um psiquiatra. E é realizado com intuito de fornecer a pessoa mais autonomia e um controle melhor sobre falhas e expectativas. É importante também pela desmistificação da doença, pois a partir de uma compreensão maior sobre ela, o dependente terá mais facilidade em elaborar as soluções de seus problemas.
Clínica de reabilitação
Outra opção de tratamento são as clínicas de reabilitação, que buscam resgatar o bem-estar e a qualidade de vida por meio da internação, visando o afastamento físico da droga e conceber novos propósitos de vida. Buscam, em sua maioria, a abstinência total das drogas, e boa parte do tratamento depende do reconhecimento da incapacidade do dependente em relação à droga.
Uma clínica de recuperação para dependentes químicos precisa ser referência no mercado nacional. Entre seus ensinamentos, pode ter o modelo tríade de tratamentos, composto por acolhimento biopsicossocial, Terapia Racional Emotiva e o programa dos doze passos, sendo este último o programa usado nos grupos de apoio Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos.
Conclusão
Como explicitado no texto, a política nacional de drogas é algo construído recentemente nas duas últimas décadas, derivado de esforços ainda mais antigos, tendo todos eles em comum o objetivo da redução da oferta e demanda.
Os efeitos da nova política ainda não foram devidamente mapeados pelas pesquisas ainda, mas com o incentivo às clínicas de reabilitação é de se esperar que o número de dependentes em tratamento cresça. Portanto, de acordo com os dados e estimativas, é provável que essa tenha sido uma mudança positiva, contudo, ainda levará um tempo para que seu impacto seja visível.
A mudança nas políticas de drogas não deve ser a única. Principalmente por ainda termos muita discrepância em nossa sociedade. E isso se confirma pelo Mapa da Desigualdade de 2021.
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Sobre a autora:
Efeitos na sociedade e a política de drogas do governo brasileiro – Observatório do Terceiro Setor | Jurnews
08/12/2021 @ 16:33
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