Direitos humanos no Brasil enfrentam aumento de ameaças e violações
Direitos humanos no Brasil vêm sofrendo cada vez mais ameaças e violações. Organizações e sociedade civil traçam estratégias para defender e assegurar direitos básicos, principalmente dos mais vulneráveis
Por: Juliana Lima
Em novembro de 2018, membros da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) visitaram o Brasil pela primeira vez em 20 anos. Entre os vários compromissos do grupo foram realizadas reuniões com autoridades de Estado do Executivo, do Legislativo e do Judiciário, com autoridades estaduais e municipais, com membros da sociedade civil, ativistas, e representantes de organizações internacionais alocados no país.
Foram centenas de depoimentos colhidos, documentos e projetos de lei analisados e visitas feitas. O resultado foi um relatório publicado oficialmente no dia 12 de fevereiro de 2021 que detalha a atual situação dos direitos humanos no Brasil. Em cerca de 200 páginas, a Comissão aponta quais são os principais temas que ameaçam os direitos humanos no Brasil e os principais grupos que são vítimas dessas violações.
Segundo a CIDH, o Brasil possui desafios principalmente para superar desigualdades socioeconômicas e históricas, que deixaram marcas profundas na sociedade. Nesse aspecto, o relatório lembra também que, mesmo após 30 anos do fim da ditadura militar, que ocorreu em 1985, o país ainda não conseguiu assegurar o direito das vítimas dos crimes contra os direitos humanos, assim como seus familiares, de acessarem a justiça.
O relatório da Comissão Interamericana reconhece os esforços e instituições de direitos humanos do Brasil e faz uma série de recomendações para fortalecer sua defesa. No entanto, como o documento analisou um período anterior à pandemia, há muito o que se acrescentar nesse debate. Segundo a organização Anistia Internacional, que divulgou mais recentemente um relatório próprio sobre o tema, a pandemia do coronavírus causou uma crise de direitos humanos no Brasil.
Grupos em risco
Para Júlia Mello Neiva, coordenadora de defesa dos Direitos Socioambientais na Conectas Direitos Humanos, é importante considerar o passado colonial do Brasil, que até hoje se reflete em desigualdades sociais e em um racismo estrutural, que sempre ameaçou a população negra e os povos tradicionais. No entanto, a coordenadora lembra também que os ataques a essas populações e outros grupos minorizados aumentaram consideravelmente desde as eleições de 2018.
“Desde então, os ataques a comunidades tradicionais aumentaram, com falas racistas, com incentivos à mineração nas terras indígenas e com o desmantelamento dos órgãos responsáveis pela proteção dos direitos desses povos. E estamos também em um momento em que está acontecendo um aumento das desigualdades sociais. Nesse contexto, a fome aumentou, há maior desemprego, precarização do trabalho e a má gestão da pandemia colocou as pessoas em risco de vida”, disse.
No relatório da Corte Interamericana de Direitos Humanos, as pessoas negras, povos indígenas e quilombolas são os primeiros grupos com direitos violados ou ameaçados citados. Durante a pandemia, os povos tradicionais tiveram altas taxas de mortalidade por covid-19, chegando a quase cinco vezes mais do que a população geral. Além disso, enfrentam atualmente o julgamento do Marco Temporal, que ameaça suas terras e já foi considerado inconstitucional por inúmeros especialistas.
Já a população negra, que é maioria nas favelas e periferias do país, também enfrentou maior risco de contaminação por coronavírus e esteve mais vulnerável à crise econômica. Um ponto ressaltado por organizações de defesa aos direitos humanos é a violência policial que atinge essa população. Segundo estudos recentes, uma pessoa negra é morta pela polícia no Brasil a cada quatro horas.
Em 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que as operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro fossem suspensas durante a crise sanitária. Mesmo assim, entre junho de 2020 e março de 2021, 797 moradores de favelas do estado foram mortos durante as incursões policiais. Além disso, casos como o do Complexo do Salgueiro, em que moradores foram mortos com traços de crueldade pela polícia, também ameaçam o cotidiano dessas pessoas.
Outros dados que preocupam as organizações que defendem os direitos humanos no Brasil são as altas taxas de feminicídio e violência contra a mulher; o aumento da população em situação de rua devido à crise econômica e social; o histórico conflito de terras que ameaça trabalhadores rurais e camponeses; o trabalho análogo ao escravo e o tráfico de pessoas; a violência contra a comunidade LGBTQIA+, as pessoas migrantes e o tratamento precarizado dado a pessoas privadas de liberdade, jovens em conflito com a lei e dependentes químicos.
Por último, a Corte Interamericana de Direitos Humanos lembra das ameaças à liberdade de expressão e informação, com os ataques a jornalistas e comunicadores. Segundo a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), o Brasil é o país mais perigoso para jornalistas na América do Sul. Além disso, segundo a organização Global Witness, o Brasil é o quarto país que mais mata ambientalistas e ativistas dos direitos humanos.
Em defesa dos direitos humanos
Se por um lado o Brasil possui um histórico de ataques aos direitos humanos, há também uma forte mobilização da sociedade civil que se mantém ao longo dos anos. São milhares de organizações divididas entre as que trabalham com o tema em sua totalidade, como a Anistia Internacional e a Conectas Direitos Humanos, e as que têm foco em um ou mais grupos ou temas ameaçados, como a defesa ambiental, defesa dos povos indígenas, de mulheres, da comunidade LGBTQIA+, organizações antirracistas, mobilizações periféricas e assim por diante.
Segundo Júlia Mello Neiva, o trabalho das organizações e da sociedade civil tem sido, principalmente, de resistência. Para ela, a primeira frente de atuação atualmente se dá na construção de narrativas, na busca de desmistificar os direitos humanos e denunciar as violações. Além disso, a participação na justiça tem sido fundamental na defesa dos direitos humanos no Brasil, como, por exemplo, nos recentes julgamentos no Supremo Tribunal Federal do Marco Temporal das terras indígenas e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecida como “ADPF das Favelas”, que prevê a redução da letalidade policial nas favelas do Rio de Janeiro.
Recentemente, diversos grupos e organizações têm levado acusações formais contra o atual governo e o presidente Jair Bolsonaro (PL) perante autoridades internacionais. É o caso do Conselho Internacional de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização dos Estados Americanos (OEA) e do Tribunal Penal Internacional, conhecido como Tribunal de Haia, onde o presidente já foi denunciado por crime contra a humanidade, incitação ao genocídio dos povos indígenas e crime ambiental pela destruição da Amazônia.
Júlia Mello lembra também que, mesmo durante a pandemia, a população brasileira foi às ruas para protestar contra a gestão da pandemia e outras causas, e que houve recorrentes campanhas de mobilização via internet. “É uma situação de emergência”, comenta. Além disso, as organizações tentam ainda mobilizar a sociedade para que ela participe de importantes decisões feitas no Congresso Nacional que podem ameaçar os direitos humanos no Brasil. “A sociedade tem que estar dentro da Casa do Povo, que é o Congresso, e nossas vozes têm de ser ouvidas”, diz.
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